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Moção – Políticas públicas para a classificação e tratamento adequado dos resíduos de filtros de cigarro

Políticas públicas para a classificação e tratamento adequado dos resíduos de filtros de cigarro

Quando falamos em alterações climáticas, falamos invariavelmente em alterações dos nossos hábitos e comportamentos: utilizar redes de transportes públicos ou meios de mobilidade suave em vez de carros, consumir menos produtos embalados, reutilizar frascos ou embalagens, para referir apenas alguns exemplos.

Para cerca de 20% da população portuguesa existe um outro hábito que é importante mudar: o hábito inconsciente, e ainda socialmente aceite, de deitar o filtro do cigarro para o chão. Um resíduo tão pequeno e tão leve que acaba por ser subestimado relativamente ao impacto que tem no ambiente e na saúde dos humanos e animais quando descartado inadequadamente.

Os desafios para encontrar soluções para as beatas de cigarro são grandes, uma vez que o impacto ambiental provocado por este resíduo em concreto requer objetivos reais e soluções integradas, estruturais e adequadas às necessidades cada vez mais evidentes da nossa sociedade.

Em 2014, foram fumados 5.8 triliões de cigarros em todo o mundo, sendo que para 2025 estão previstos 9 triliões . Em 2016, o consumo global na Europa foi de 1.2 triliões cigarros. Em Portugal, o número de cigarros consumidos é de 10 biliões.

São 7 mil beatas de cigarro que vão parar ao chão a cada minuto. 7 mil resíduos aparentemente inofensivos, mas cada um deles contém mais de quatro mil substâncias tóxicas/químicas, em que pelo menos 250 são cancerígenas e prejudiciais à saúde.

Nicotina, arsénico, níquel, acetato de chumbo e cianeto são apenas algumas das substâncias que, depois de fumado o cigarro, ficam armazenadas no filtro que é deitado ao chão, filtro esse que, por sua vez, é feito de acetato de celulose (plástico), não é biodegradável e demora cerca de 10 anos a degradar-se.

Os impactos destas substâncias no ambiente são imensuráveis: quando descartadas ainda acesas são responsáveis por 30% dos incêndios , contaminam o solo, são ingeridas pelos animais interferindo não só com a biodiversidade como também com os alimentos que ingerimos, além de causarem a morte a muitos animais marinhos , entopem os esgotos, são levados pela chuva e pelo vento acabando a poluir os rios, os mares, a terra, as árvores, os canteiros, os parques as calçadas e todos os demais espaços urbanos.

Alguns fumadores atiram o filtro de cigarro para o chão como um gesto automático e inconsciente, sem qualquer noção do real perigo deste resíduo, não considerando este um ato inadequado e nem entendendo sequer a beata como lixo, por ser tão pequena e móvel. Mais, 80% dos fumadores justificam este hábito por falta de equipamentos e de infraestruturas na rua para este efeito.

Mas a origem do problema das beatas no ambiente não está apenas no comportamento de quem fuma. Está também na forma de atuação e códigos de conduta e boas práticas da indústria tabaqueira que, como qualquer outra indústria, tem o dever de alertar para o impacto que este resíduo tem no meio ambiente e na biodiversidade existente. É importante envolver a indústria no combate a esta problemática, pois é aí que começa a consciencialização e é também uma forma de partilhar a responsabilidade por todos/as.

Em Portugal, a beata não está classificada ou reconhecida como resíduo poluente. Uma correta classificação iria trazer vantagens não só ao nível da consciencialização, pois as pessoas iriam finalmente perceber o que contém um filtro de cigarro e onde o devem depositar corretamente, como também iria facilitar a logística de recolha seletiva a nível nacional e determinar o seu correto destino, que deverá ser aquele que apresenta o menor custo financeiro e o menor impacto no ambiente.

Se recuarmos há uns anos atrás, temos o excelente exemplo da Ecopilhas. Foi necessária a classificação das pilhas como resíduo, educar a população para o perigo de um mau descarte das mesmas e, hoje em dia, são muitas as pessoas que guardam as suas pilhas para as depositar no “Pilhão”.

Este mesmo processo deve ser feito com o resíduo dos filtros de cigarro, tendo em conta as suas graves consequências para o planeta.

Considerando que:
Os impactos do descarte inadequado do filtro do cigarro têm consequências ao nível da saúde (pelos químicos nele concentrados que acabam na sola dos nossos sapatos, dentro da nossa casa e nas mãos das nossas crianças), ambientais (poluição do solo, do mar e da natureza, contaminando a biodiversidade e provocando, por vezes, incêndios) e económicos (custos com equipas de limpeza urbana ou despoluição da água);

Estes impactos dos filtros de cigarro no chão têm origem não só nos comportamentos dos fumadores, mas também sobretudo e primeiramente na indústria;

As alterações climáticas são uma realidade e a temática das beatas enquadra-se em 4 dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, sendo eles o 12 (Produção e Consumo Sustentáveis – Garantir padrões de consumo e de produção sustentáveis), o 13 (Ação Climática – Adotar medidas urgentes para combater as alterações climáticas e os seus impactos), o 14 (Proteger a Vida Marinha – Conservar e usar de forma sustentável os oceanos, mares e os recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável) e o 15 (Proteger a Vida Terrestre – Promover, restaurar e proteger o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, travar e reverter a degradação dos solos e travar a perda de biodiversidade);

O combate pioneiro de Portugal a este resíduo pode colocar o país num outro patamar e servir de exemplo de cumprimento dos ODS;

A Diretiva 2008/56/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Junho, alterada pela Diretiva (UE) 2017/845 da Comissão, designada por Diretiva Quadro Estratégia Marinha, determina que os Estados-Membros da União Europeia tomem as medidas necessárias para obter ou manter o bom estado ambiental do meio marinho ate 2020. Os dados e informações dos programas de monitorização ao abrigo desta Diretiva permitirão um melhor entendimento das fontes de lixo nos mares e os seus impactos, sendo que as beatas constituem já 18% do lixo recolhido nas praias;

Outros dados revelam que os resíduos de plástico correspondem a 80% de todo o lixo encontrado em praias e zonas costeiras, bem como em rios e estuários. Os itens mais comuns encontrados nas praias incluem filtros de cigarro, pedaços de plástico e poliestireno, copos e tampas e cotonetes, entre outros;

No relatório de 2017 da Organização Mundial de Saúde (OMS) intitulado “Tabaco – Uma Ameaça ao Desenvolvimento”, que avalia o impacto do tabaco na saúde, na economia e, pela primeira vez no ambiente, é revelado que cerca de dois terços dos 15 mil milhões de cigarros vendidos a cada dia são deitados fora em zonas prejudiciais ao ambiente.

Assim, e face ao exposto, vem o Grupo Municipal do PAN propor que a Assembleia Municipal de Lisboa, na sua Sessão Ordinária de 7 de maio de 2019, ao abrigo do disposto no artigo 15.º, alínea c) conjugado com ao alínea a) do n.º 2 do artigo 48.º, ambos do Regimento e do artigo 25.º, n.º2, alíneas a) e k) do Anexo I da Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro, delibere apelar ao Governo no sentido de:

  • Realizar um estudo sobre o filtro do cigarro que permita classificá-lo relativamente às suas características de perigosidade, de acordo com a sua composição, para que se possa então determinar a sua devida separação dos outros resíduos, à semelhança do que já acontece com o cartão, plástico, vidro ou pilhas;
  • Criar e instalar depósitos exclusivos para os filtros de cigarro, que facilitem a sua recolha e o seu destino, à semelhança do “Pilhão” para as pilhas;
  • Criar campanhas a nível nacional de educação cívica/educação ambiental/informação/ sensibilização para o que é um filtro de cigarro, de que materiais e substâncias é composto e quais as razões porque deve ser depositado em contentores específicos, para alterar o comportamento dos fumadores alertando para os perigos de saúde humana e ambiental;
  • Realizar um estudo sobre o impacto financeiro e ambiental do tratamento/destino dado a este resíduo (incineração ou outros) para que se opte pelo tratamento mais sustentável económica e ambientalmente;
  • Apelar à indústria tabaqueira e à academia que estudem alternativas de materiais para a composição do filtro que sejam menos nocivos para o ambiente do que o acetato de celulose (plástico);
  • Apelar à indústria tabaqueira que sinalize visualmente nos maços de tabaco onde devem ser depositados os filtros, para que os fumadores estejam corretamente informados.
  • Mais, delibere ainda:
    Enviar a presente deliberação ao Presidente da República, ao Presidente da Assembleia da República, aos Grupos Parlamentares da Assembleia da República, ao Primeiro-ministro, à Ministra da Saúde e ao Ministro do Ambiente e da Transição Energética.

Lisboa, 30 de abril de 2019

O Grupo Municipal do Pessoas – Animais – Natureza
Miguel Santos Inês de Sousa Real