Democracia, Participação Cidadã e Organização do Estado

O desenvolvimento transversal de instituições eficazes, responsáveis e transparentes é imposto ao nosso país como uma das prioridades governativas da próxima década por via do objetivo 16 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, estabelecidos em 2015. Para atingir este objetivo que vincula o nosso país, o PAN identifica três áreas de ação que considera serem essenciais: Democracia, Sistema Eleitoral e Participação Cidadã, Organização do Estado e Administração Pública e Poder Local. 

Democracia, Sistema Eleitoral e Participação Cidadã

Para o PAN é imperioso mudar o sistema eleitoral, tornando-o mais agregador, convidativo à participação, e permitindo o adequado escrutínio e uma participação que vá além do voto em eleições. 

Esta foi uma das prioridades da ação do PAN na Assembleia da República, onde conseguimos, por exemplo, garantir um alargamento das matérias passíveis de serem objeto de iniciativas legislativas de cidadãos/ãs ou assegurar um conjunto de medidas de apoio às organizações não-governamentais para que melhor pudessem fazer face à crise sanitária provocada pela COVID-19 (como a atribuição de isenção de imposto de selo na reestruturação de dívidas em moratória).

Porém, a anterior legislatura foi marcada por diversos retrocessos, tais como o fim dos debates quinzenais ou o aumento do número de assinaturas necessário para que uma petição de cidadãos/ãs seja discutida pelo plenário da Assembleia da República. Estes retrocessos foram, aliás, invocados como uma das causas justificativas para a descida na classificação no The Democracy Index de 2020 na qualificação de Portugal como um país com uma democracia com falhas.  

Chegamos a 2022 com um cenário em que nas últimas eleições autárquicas tivemos a segunda maior abstenção neste tipo de eleições na nossa democracia (46,35%) e em que 41% dos/das jovens afirmam ter muito pouco ou nenhum interesse em política.

Este cenário convoca-nos a agir já, por isso o PAN propõe:

  • Proceder à criação de uma assembleia de cidadãos/ãs, a funcionar junto da Assembleia da República, com competência para a apresentação de propostas de revisão constitucional e de alteração da legislação em vigor tendentes a assegurar a reforma do sistema político e o aprofundamento da participação cidadã. Esta medida segue o exemplo da Irlanda, em 2016, e da Alemanha, em 2019, sem prejuízo do direito de livre iniciativa das forças políticas com representação parlamentar;
  • Consagrar, por via de revisão constitucional, o direito de sufrágio aos/às cidadãos/ãs com idade igual ou superior a 16 anos;
  • Reduzir o número de círculos eleitorais dos atuais 22 para 10 – Norte, Centro, Alentejo, Algarve, Área Metropolitana do Porto, Área Metropolitana de Lisboa, Açores, Madeira, Emigração e um círculo de compensação -, por forma a impedir a injustiça subjacente ao atual sistema eleitoral, que a cada eleição legislativa faz com que cerca de meio milhão de votos válidos não sirvam para eleger qualquer deputado;
Reduzir o número de círculos eleitorais de 22 para 10, por forma a impedir que, a cada eleição legislativa, cerca de meio milhão de votos válidos não sirvam para eleger qualquer deputado, tal como acontece no atual sistema eleitoral.
  • Alterar o método matemático usado na distribuição prévia dos mandatos por círculo de modo a não prejudicar os círculos de menor dimensão, substituindo, através de revisão constitucional, o método de Hondt pelo método de Sainte-Laguë;
  • Alterar a legislação eleitoral por forma a facilitar o acesso ao voto antecipado e a aproximar os locais de voto das pessoas, com vista a combater a abstenção;
  • Alargar o direito de voto em mobilidade no âmbito das eleições para os órgãos das autarquias locais a todos/as os/as eleitores/as que se encontrem impedidos de se deslocar à assembleia de voto no dia da eleição;
  • Promover a realização de um estudo com vista à viabilização da possibilidade de entrega eletrónica das diferentes candidaturas aos atos eleitorais ou junção dos seus documentos e certidões emitidas pelas entidades oficiais, como as Juntas de Freguesia, no que diz respeito à certidão de eleitor;
  • Alterar a Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais, de forma a assegurar:
  1. A revogação das isenções de IMI, de impostos sobre o património e imposto automóvel atualmente em vigor; 
  2. A diminuição em 50% dos limites legais das despesas das campanhas eleitorais;
  3. A sua aplicação às campanhas eleitorais de eleições primárias internas;
  4. A permissão de reutilização de materiais de campanha eleitoral noutras ações das forças políticas;
  5. A publicação online, em dados abertos e em tempo real, das contas dos partidos e candidaturas;
  • Prever uma limitação de três mandatos aplicável aos membros do Governo e a todos os membros dos órgãos executivos das autarquias locais;
  • Reverter as alterações aprovadas em 2019, assegurando a reposição dos debates quinzenais com o Governo e a redução do número mínimo de assinaturas para a apreciação de uma petição no plenário da Assembleia da República das atuais 7.500 assinaturas para 4.000; 
  • Reduzir para 15 mil o número mínimo de subscritores/as das Iniciativas Legislativas de Cidadãos/ãs e adotar um processo de submissão e subscrição mais simples;
  • Criar uma assembleia de cidadãos/ãs com competências de monitorização e controlo da execução dos fundos europeus atribuídos a Portugal através do Plano de Recuperação e Resiliência;
  • Prosseguir as iniciativas Orçamento Participativo Portugal e Orçamento Participativo Jovem, assegurando o reforço das verbas que lhe estão alocadas e um modelo que garanta uma execução mais célere e com a participação dos/as proponentes vencedores/as;
  • Assegurar a criação de um grupo de trabalho, no âmbito da Assembleia da República, com competência para proceder à auditoria da execução da iniciativa Orçamento Participativo Portugal, desde 2016, que garanta a auscultação dos/das proponentes dessas propostas; 
  • Aprovar um regime jurídico dos orçamentos participativos nas Autarquias Locais que crie incentivos ao desenvolvimento destes processos em autarquias com menos recursos e que preveja mecanismos de auditoria cidadã da sua execução;
  • Estender a boa experiência do programa parlamento dos jovens ao âmbito do Governo, por via da criação da figura dos conselhos de ministros dos jovens e sua realização mensal, e ao âmbito municipal, por via da criação das assembleias municipais jovens;
  • Assegurar a participação efetiva dos cidadãos no procedimento de formação dos atos legislativos do Governo, alargando o prazo legal de consulta direta e inscrevendo legalmente um prazo mínimo de consulta pública, não inferior a 45 dias, e novos mecanismos de publicidade destas consultas;
  • Promover a capacitação de Organizações Não-Governamentais, facilitando o acesso aos apoios públicos e privados disponíveis para todas as áreas de intervenção social, através da criação de um portal que reúna toda a informação, bem como aconselhamento e apoio às candidaturas.

Organização do Estado e Administração Pública

Para o PAN é necessário mudar a atual organização do Estado, respondendo aos desafios que caracterizam o nosso país: 

  • Excesso de centralização nas grandes cidades e no poder estadual
  • Concentração no litoral
  • Falta de um verdadeiro nível intermédio de poder
  • Falta de confiança das pessoas na Administração Pública,
  • A existência de procedimentos de recrutamento de trabalhadores/as para a Administração Pública demasiado burocráticos e longos, 
  • Insuficiente reconhecimento e valorização dos/das trabalhadores/as da Administração Pública que, por terem sido alvo de cortes injustos e valorizações salariais insuficientes, entre 2009 e 2021 sofreram uma perda de poder de compra na ordem dos 10,3%.

Face a este enquadramento geral, o PAN vai:

  • Empreender um debate alargado sobre a Regionalização, que envolva a Administração Pública, a academia e a sociedade civil;
  • Proceder a uma revisão constitucional que proceda à eliminação da pergunta de alcance regional e à clarificação dos termos do referendo de âmbito nacional de forma a assegurar que a regionalização se concretizará desde que os votos favoráveis sejam superiores aos votos contra, independentemente do número de votantes;
  • Aprovar um plano nacional de desconcentração territorial que, com base num cronograma estruturado e numa prévia e rigorosa avaliação de custo-benefício, relocalize, para fora de Lisboa e preferencialmente para o interior, a sede de órgãos de soberania e entidades públicas;   
Aprovar um plano nacional de desconcentração territorial que, com base rigorosa avaliação de custo-benefício, relocalize, para fora de Lisboa e preferencialmente para o interior, a sede de órgãos de soberania e entidades públicas.
  • Consagrar a eleição direta pelos/as cidadãos/ãs dos/das presidentes e vice-presidentes das CCDR e da previsão de uma tutela de legalidade do poder estadual sobre a conduta das direções das CCDR, por forma a promover a democratização da governação territorial e uma efetiva independência das direções das CCDR face ao Governo;
  • Reforçar a legitimidade democrática das Áreas Metropolitanas e das Comunidades Intermunicipais, com a instituição de um novo modelo assente na eleição direta, por sufrágio universal, do órgão deliberativo e do/da Presidente do órgão executivo;
  • Reforçar o papel da Assembleia da República no processo de designação dos membros dos conselhos de administração das entidades reguladoras e do Banco de Portugal, dando um caráter vinculativo ao parecer da comissão competente para a audição e estabelecendo a audição obrigatória do Ministro do Governo responsável pela escolha do nome proposto;
  • Implementar um modelo de recrutamento dos cargos dirigentes da Administração Pública que estabeleça métodos diferenciados conforme estejam em causa cargos predominantemente técnicos  e cargos onde predomine a dimensão de confiança política ainda que com exigentes critérios curriculares legalmente definidos e com uma duração igual à do mandato do Governo; 
  • Consagrar o limite de renovações das comissões de serviço dos cargos de direção intermédia para promover a sua mudança e rejuvenescimento;
  • Garantir que os procedimentos de recrutamento de trabalhadores/as para a Administração Pública passam a ser organizados e processados totalmente por via eletrónica. Garantir ainda que é divulgada  informação detalhada e acessível sobre o processamento nas suas diferentes fases, no portal da Bolsa de Emprego Público;
  • Criar um documento único de participação nos procedimentos concursais de recrutamento para a Administração Pública;
  • Garantir um maior escrutínio dos procedimentos concursais de recrutamento para Administração Pública, possibilitando a realização ordinária de auditorias, por sistema, aos procedimentos concursais, a efetuar por entidade pública independente;
  • Assegurar uma valorização salarial dos/das trabalhadores/as da Administração Pública, que seja capaz de compensar os 10,3% de perda do seu poder de compra verificada entre 2009 e 2019, bem como um aumento do subsídio de refeição capaz de lhes dar um valor ajustado à realidade do país;
  • Reformular o estatuto dos técnicos superiores da Administração Pública de forma a garantir uma valorização salarial capaz de permitir uma captação de quadros que compita com o setor privado e, ainda, de estancar a fuga de mão de obra qualificada que se tem verificado na última década;
  • Criar para o biénio de 2020-2022 um regime excecional de avaliação do desempenho dos/das trabalhadores/as da Administração Pública que estiveram na linha da frente do combate à crise sanitária provocada pela COVID-19;
  • Melhorar o Sistema de Normalização Contabilística para as Administrações Públicas, de forma a garantir que todas as entidades públicas apresentam as suas contas de acordo com este novo sistema, uma maior articulação entre a informação no sistema e as demonstrações financeiras consolidadas a integrar o Orçamento e a Conta Geral do Estado, bem como a realização de ações de capacitação dos recursos humanos.

Poder Local

Ao nível do Poder Local é necessário atuar de forma a garantir uma verdadeira descentralização de competências e uma reforma na legislação autárquica que assegure um funcionamento verdadeiramente democrático dos órgãos das autarquias locais.

Demonstrativo da falta de medidas adequadas à realidade do Poder Local é o processo de descentralização em curso, que o Governo quer concluir em Março de 2022, sem garantir os recursos necessários para esse efeito e mesmo sabendo que no ano de 2021 a maioria das câmaras municipais não aceitou a descentralização de competências nas áreas da Saúde, da Educação e da Ação Social. 

O PAN irá:

  • Adiar a consolidação do processo de descentralização nas áreas da educação, saúde e ação social para 31 de Março de 2023, empreendendo no quadro da Assembleia da República um debate alargado que, envolvendo os municípios, a academia e a sociedade civil, avalie os resultados da fase facultativa de descentralização, a adequação das verbas que foram sendo transferidas, e a necessidade de recalendarização para depois de Março de 2023, ao mesmo tempo que apresenta proposta sobre os recursos necessários para garantir essa consolidação;
  • Criar Comissões Regionais de Apoio Técnico ao processo de descentralização para que, antes e após a consolidação do processo de descentralização, prestem aos municípios os esclarecimentos que possam surgir no âmbito deste processo;
  • Identificar, em diálogo com as Autarquias Locais, a academia e a sociedade civil, novos domínios onde se possa efetivar a descentralização no mandato autárquico de 2021-2025, assegurando um modelo que garanta um período transitório em que as competências a delegar e os recursos que lhe estão associados são fixados mediante negociação prévia com cada município e acordo fixado em Contrato-Programa;
  • Garantir que, em sede do Orçamento do Estado de 2022, existe um mecanismo extraordinário, com um valor fixado por acordo com os municípios, que assegure compensação das despesas excecionais efetuadas pelos municípios no combate à crise sanitária, social e económica, provocada pela COVID-19;
  • Reforçar as competências das Assembleias Municipais, designadamente através do reconhecimento da possibilidade de apresentar e aprovar propostas de alteração às propostas de orçamento apresentadas pela Câmara Municipal (desde que tenham um efeito neutro no saldo orçamental e não agravem o nível de endividamento) e da atribuição da competência para aprovação dos documentos de prestação de contas;
  • Alterar a legislação que permite a presença dos/das Presidentes de Junta de Freguesia nas Assembleias Municipais como membros por inerência, mantendo-os/as como membros, mas sem direito de voto, fazendo uso da permissão constitucional prevista na parte final do artigo 251.º da CRP;
  • Estabelecer na legislação autárquica a obrigatoriedade de transmissão e disponibilização online das reuniões dos órgãos das autarquias locais, tornando em regra as exceções aprovadas em contexto da crise sanitária provocada pela COVID-19;
  • Concretizar o disposto no n.º 3, do artigo 239.º da CRP, por via da aprovação de um regime jurídico que atribua à aprovação das moções de censura contra as Câmaras Municipais e as Juntas de Freguesia um efeito de demissão do órgão censurado, definindo as regras referentes à respectiva destituição;
  • Alargar o direito de consulta prévia das forças da oposição nas Autarquias Locais a outros assuntos autárquicos estruturantes para além dos documentos previsionais autárquicos, nomeadamente o exercício dos poderes tributários do município ou a revisão dos instrumentos de gestão territorial;
  • Consagrar um princípio de representação proporcional quanto à composição das mesas dos órgãos deliberativos das Autarquias Locais;
  • Consagrar a obrigatoriedade legal das Autarquias Locais reservarem, nas suas publicações periódicas e nos seus sítios institucionais na internet, espaços para que os/as titulares do Direito de Oposição possam difundir as suas posições sobre os diferentes assuntos de interesse local e o seu trabalho;
  • Consagrar o direito dos/das eleitos/as nas Assembleias Municipais e dos respetivos Grupos Municipais de terem as condições adequadas para o exercício das suas funções;
  • Rever as regras do Programa de Apoio à Economia Local de forma a:
  1. Garantir o afastamento do atual modelo de aplicação semiautomática da taxa máxima de IMI e a assegurar a previsão de um modelo que dê primazia à adoção de medidas alternativas (de aumento de receita ou diminuição de despesa) tendentes à obtenção de resultados equivalentes aos que seriam obtidos por via da aplicação da taxa máxima de IMI e que esses resultados não se façam por conta da redução de despesa nas áreas da educação, da saúde, da habitação, da proteção social, de proteção animal e do ambiente;
  2. Assegurar a reposição da responsabilização dos/das autarcas que violem de forma grave as regras deste programa;
Garantir o afastamento do atual modelo de aplicação semiautomática da taxa máxima de IMI e assegurar a previsão de um modelo que dê primazia à adoção de medidas alternativas (de aumento de receita ou diminuição de despesa), tendentes à obtenção de resultados equivalentes e que não se façam por conta da redução de despesa nas áreas da educação, da saúde, da habitação, da proteção social, da proteção animal e do ambiente.
  • Dar seguimento, no quadro da Assembleia da República por via da apresentação de projetos de lei, às propostas da reversão das agregações de freguesias a régua e esquadro ocorridas com a reforma territorial de 2013, provenientes dos órgãos autárquicos nos termos da Lei n.º 39/2021, de 24 de junho.