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“Tradição” que conduz ao naufrágio da ética

Conforme sabido, existem fortes suspeitas de que no decurso da semana passada, um touro perdeu a vida afogado durante uma tourada à corda realizada no Porto Judeu, na ilha Terceira. O animal caiu ao mar durante o evento no porto, sofrendo lesões, que culminaram num desfecho absolutamente trágico e que, lamentavelmente, não é caso isolado. 

O momento em que o animal cai no mar foi registado e partilhado nas redes sociais, onde é possível vê-lo em agonia dentro de água, por vezes submerso, onde permaneceu durante largos minutos, enquanto era puxado de forma grotesca pela própria corda atada ao pescoço, numa tentativa de ser retirado da água. A par do evidente sofrimento físico, este animal enfrentou, também, o risco de asfixia, perante a serenidade e o regozijo de muitos.  

Um episódio brutal e cruel, que ilustra com crueza os bastidores destas prácticas: dor, medo, sofrimento e morte perante a passividade de quem tem o dever de zelar pelo bem-estar?animal. Onde estavam as autoridades? Onde estava o delegado municipal responsável por garantir a segurança animal? São algumas das questões que o PAN/Açores pretende ver esclarecidas na denúncia remetida às autoridades competentes, incluindo à Provedora Regional do Animal, a par dos esclarecimentos formais solicitados ao Governo Regional dos Açores, à Câmara Municipal da Praia da Vitória e à PSP.  

A nossa posição perante a tauromaquia é clara e já a fizemos ouvir no Parlamento Regional: as touradas, à corda ou de praça, são uma práctica violenta, que tem vindo a registar um aumento significativo de ferimentos, bem como da gravidade dos mesmos, em participantes e animais, muitas vezes com consequências fatais, que apenas contribuem para o congestionamento do já sobrecarregado Serviço Regional de Saúde, por razões inteiramente evitáveis.  

A ausência de progresso nas condições de segurança é evidente e preocupante – prova disso é que no Verão passado, alertámos e denunciámos diversas situações semelhantes que foram, aparentemente, ignoradas. O resultado? Mais uma vítima. Uma vida perdida ao abandono das falhas do sistema. A par disso, somam-se as lesões, por vezes fatais, dos participantes/espectadores.  

É inadmissível que, na terceira década do século XXI, continuemos a assistir a manifestações de entretenimento que recorrem à violência contra animais, sem que haja fiscalização efectiva ou responsabilidade das autoridades que supervisionam os eventos, tampouco que haja a efectiva garantia da segurança dos mesmos – se é que possível. Esta passividade institucional demonstra uma estagnação ética e normativa que perpectua prácticas anacrónicas, ignorando o bem-estar animal. Esta tragédia não pode limitar-se a mais um caso “lamentado” que agora se tenta justificar, mas que custou a vida de um animal. Urge repensar-se e, desejavelmente, abolir-se prácticas que atentam contra a integridade de seres sencientes. A tradição não pode continuar a servir de escudo?para?crueldade.