Exma. Senhora Presidente e restantes membros da mesa, Exmas. Senhoras Vereadoras e Exmos. Senhores Vereadores, Exmas. e Exmos. Colegas Deputadas e Deputados, restante público na plateia e Comunicação Social.
Ontem comemorou-se o septuagésimo (70.º) aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Este ano comemora-se também os 40 anos da sua publicação no Diário da República em Portugal e o quadragésimo (40.º) aniversário da adesão de Portugal à Convenção Europeia dos Direitos Humanos.
Num momento em que o Mundo vive tantas guerras, onde morrem à nossa porta crianças, mulheres e homens refugiados, com tanta discórdia interna na própria Europa, não nos podemos esquecer que a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi proclamada na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas três anos após terem terminado as atrocidades da II Guerra Mundial e veio anunciar direitos iguais e inalienáveis para todos os seres humanos, sem qualquer distinção: de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação.
Se é certo que se trata de uma Declaração de princípios sem poder vinculativo legal, os seus princípios foram posteriormente transpostos para pactos e convenções internacionais, os quais constituem obrigações legais.
A Convenção Europeia dos Direitos Humanos, assinada em Roma em 1950 e ratificada em Portugal em 1978, veio vincular os Estados Partes ao respeito integral pelos direitos humanos e ao criar o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem permitiu, a partir de então, que qualquer pessoa cujos direitos fossem violados por um Estado pudesse apresentar o seu caso ao Tribunal.
Este conceito de direitos humanos enquanto garantias que salvaguardam a dignidade de todas as pessoas em todos os lugares, independentemente das características da pessoa, indivisíveis e inalienáveis, tem percorrido um longo caminho.
Um caminho que começou há muito, muito tempo atrás, que teve um percurso conturbado com fortes opositores e que ainda hoje não podemos dar como garantido para grande parte da população.
A comunidade internacional prometeu que as tais atrocidades da II Guerra Mundial não se viriam a repetir, contudo, este ano na Síria a cada hora morre uma criança, de acordo com a UNICEF.
Os direitos humanos são universais, nascem com cada um e cada uma de nós, e sãosupostamentegarantidos e juridicamente protegidos.
Quem não tem casa, pouco acreditará que tem direito a alguma justiça ou dignidade.
Quem sente que quando entra numa loja ficam mais atentos por causa do seu tom de pele, nada acreditará na inexistência de racismo.
Quem tem fome terá pouca vontade de expressar a sua opinião, embora seja livre de o fazer.
Uma pessoa agredida ou violada ou escravizada, com toda a certeza não se lembrará do que está escrito na Declaração Universal dos Direitos Humanos ou na Constituição, só sentirá o abandono da sociedade, a impotência, a falta de justiça, a tristeza.
No passado dia 25 de novembro, por ocasião do Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres, a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género lançaram uma infografia relativa ao combate à violência contra as mulheres.
O texto de apresentação diz que esta demonstra a evolução do investimento público na área de apoio às vítimas de violência doméstica, numa lógica de transparência e boa governança.
Em 2017 houve 26.713 participações; 20 femicídios; 79% das vítimas eram mulheres; e, citamos, “embora se verifique um aumento de cerca de 13,5% no número de pessoas condenadas pelo crime de violência doméstica, o número de condenações é ainda residual face ao número de participações registadas nas forças de segurança”.
Mesmo que não seja assim direto, dado que a justiça também não é assim tão rápida, como sabemos: estamos a falar de 26.713 participações e de 1.457 condenações, quando também sabemos que muitas vezes as penas são suspensas.
De fora destes dados oficiais, ficam ainda os suicídios que têm origem na violência doméstica, nunca contabilizados.
Estes são números para nos orgulharmos de alguma evolução ou é só para chorarmos perante a nossa total falta de capacidade para acabar com o inferno em que estas pessoas vivem?
Por cá, em Lisboa continuamos a aguardar que esta vereação se preocupe com a violência doméstica, com a igualdade de género e com o fim de todas as discriminações e apresente a Estratégia Municipal para a Igualdade, que já virá bastante atrasada.
Onde estão os direitos destas pessoas? Destas mulheres?
Talvez esta seja uma boa altura para relembrar que a elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos teve o importante contributo de várias mulheres, entre outras: Eleanor Roosevelt, que liderou o comité que redigiu a Declaração Universal dos Direitos Humanos e que o manteve unido apesar das diferenças profundas; Bodil Begtrup da Dinamarca que defendeu que a Declaração Universal se referisse a “todos” ao invés de “todos os homens”; Begum Shaista Ikramullah, uma delegada do Paquistão, que inseriu o artigo 16º, sobre direitos iguais no casamento; Hansa Mehta da Índia que defendeu a alteração de “Todos os homens” para “Todos os seres humanos nascem livres e iguais…” e Minerva Bernadino, da República Dominicana, que conseguiu a importante inserção no preâmbulo da “igualdade entre homens e mulheres”.
Por outro lado, temos também que referir a dificuldade com que vivem as pessoas que têm algum tipo de deficiência. A dificuldade para exercerem os seus direitos básicos. Conseguirem uma casa com acesso tranquilo e fácil à rua, ou elevadores no metropolitano, ou um atendimento num hospital se forem surdos, só para dar alguns exemplos.
Mais: existe pobreza em Lisboa! De acordo com o Retrato de Lisboa, elaborado pelo Observatório de Luta Contra a Pobreza na Cidade de Lisboa, o peso da população dependente tem vindo a aumentar desde 1981 face à população em idade ativa; os processos de despedimento coletivos originaram o desemprego de 17.126 pessoas! Há pessoas em situação de sem abrigo, sem teto ou a dormir em carros nos parques de estacionamento que utilizamos diariamente!
Relembramos, também, que o tráfico de seres humanos é a completa violação de todos os direitos humanos, causado pela pobreza, e afeta sobretudo mulheres e crianças, tendo por objetivo sobretudo a exploração sexual, a servidão doméstica, casamentos precoces, infantis e forçados.
Por isso, não podemos deixar de referir que, em 2017, 9 das 13 CPCJs com maior número de processos se situam na Área Metropolitana de Lisboa, o que nos parece muito preocupante.
Depois desta reflexão, ao lermos o preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos percebemos que Lisboa está com dificuldades em cumpri-la e que não estamos a conseguir garantir o “reconhecimento da dignidade” para todas as pessoas, e muito menos direitos iguais, o que é considerado o “fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”.
Em Lisboa não está tudo bem!
E porque as autarquias vão ser os atores principais da governação com a descentralização e, por isso, cabe-lhes a promoção e proteção dos direitos humanose fazer cumprir a Constituição, os tratados, as declarações, as cartas e igualmente governar com empatia.
Assim, hoje, apresentamos ao plenário uma recomendação para criação de um Observatório Municipal dos Direitos Humanos, que tenha por missão zelar pelo respeito dos direitos humanos na nossa cidade e uma moção apelando ao Governo que crie mecanismo necessários que permitam tornar mais célere a integração das crianças e jovens a quem foi determinada a medida de proteção de colocação em casas de acolhimento residencial nos estabelecimentos de educação e de ensino que sejam os mais adequados para as suas necessidades, quer seja por integração nos estabelecimentos na proximidade geográfica da sua casa de acolhimento, quer seja por colocação nos estabelecimentos que têm as valências mais adequadas às suas necessidades e/ou aos seus projetos de vida, através de vagas específicas criadas para o efeito.
Pessoas – Animais – Natureza
(GM PAN)
Miguel Santos Inês de Sousa Real