AçoresAnimaisJustiçaOpinião

Justiça animal

A 18 de Agosto comemoraram-se dois anos da entrada em vigor de um regime legal mais gravoso para os crimes praticados contra animais de companhia.

Nessa altura, pela mão do PAN, procedeu-se à alteração do ordenamento jurídico inserindo-se alterações no Código Penal e no Código de Processo Penal: autonomização do crime de morte do animal de companhia e autonomização do crime de abandono do animal de companhia; agravamento das penas; e a suspeita da prática de crime passa a ser suficiente para a recolha do animal – celeridade da intervenção dos órgãos de polícia criminal no resgate.

Um marco no progresso civilizacional que robusteceu o regime legal dos crimes praticados contra animais.

O legislador ouviu a reivindicação que inflamava o espírito social: a necessidade de agravação das consequências para quem praticar, por ação ou omissão, atos de violência contra animais.

Porém, se essa data é de celebração, há outra, próxima, que não o é: o Dia Internacional do Animal Abandonado, este ano assinalado a 20 de Agosto.

Os dados do relatório agora divulgado pelo ICNF, revelam que no ano de 2021 foram recolhidos, em todo o país, cerca de 43 600 animais pelos Centros de Recolha Oficial. Esses números refletem um aumento de, sensivelmente, 40% em relação a 2020. É preciso recuar até 2017 para se igualarem esses dados oficiais.

Ponta Delgada lidera o top 5 dos concelhos, em todo o país, com índice mais elevado de recolha de animais, representando quase 40% dos animais recolhidos nos Açores. Muito por conta dos protocolos celebrados com outros municípios sem CRO.

Ressalve-se que os animais recolhidos pelas associações de proteção animal não estão incluídos nos dados do relatório.

Ora, considerando os números do relatório, o Dia Internacional do Animal Abandonado é um dia de reflexão sobre as políticas que temos e que queremos em matéria de proteção e bem-estar animal.

A montante deve apostar-se em campanhas públicas, ininterruptas e gratuitas de esterilização. Um investimento cujos benefícios ultrapassam os custos. O investimento inicial permite reduzir custos com os CRO’s e, principalmente, acautelar o bem-estar animal. É uma política preventiva que salvaguarda o bem-estar animal.

Porém, a jusante, deve promover-se a fiscalização, aplicando-se sanções aos prevaricadores do bem-estar animal.

Desse modo, o papel da justiça é determinante no combate à violência contra os animais. O que não tem acontecido. Pois, o Tribunal Constitucional tem proferido sucessivas decisões que esvaziam a possibilidade legal de os prevaricadores serem punidos.

Esta semana foi noticiada a possibilidade de o TC proferir uma nova decisão – que é velha, se considerarmos as sucessivas decisões com o mesmo sentido – sobre a inconstitucionalidade do crime de morte e maus-tratos a animais de companhia.

Aqui chegados, a questão que clama resposta é: “abater um cão a sangue-frio e sem motivo aparente ainda é crime”? Foi esta a pergunta que o Ministério Público colocou ao Palácio Ratton no recurso interposto no caso do agricultor que descarregou uma caçadeira num pastor alemão que se “atreveu” a passar por ele.

A, aparente, inconstitucionalidade não retrata a justiça da lei.

In Açoriano Oriental, 20 de Agosto de 2022