Sendo o orçamento municipal um documento estruturante das políticas que se querem implementar e desenvolver, deve sempre refletir uma ideia de progresso económico, social e ambiental num quadro de sustentabilidade. É neste modelo conceptual que a posição do PAN se afirma, passando por uma visão integrada e interligada entre as diferentes áreas: desde a adaptação, a mitigação e a resiliência em relação às alterações climáticas, a mobilidade, o ordenamento do território, a habitação, a educação, a saúde, a sustentabilidade das contas, o investimento duradouro e a proteção animal.
Em concreto, importa, desde logo, saber se este orçamento encerra em si os princípios políticos do PAN. De facto, após a análise do Orçamento e Plano para 2021, percebemos que este é mais um documento igual aos anteriores, um quase “copy and paste” dos modelos anteriores. Um documento que encerra em si um leque de boas intenções, mas que não é mais do que isso. Continua a ser um orçamento desprovido de politicas em temas estruturantes como seja o Ambiente e o bem-estar e proteção animal.
De uma forma geral, podemos afirmar que estivemos ao lado do executivo, votando favoravelmente matérias no âmbito da mobilidade, das politicas sociais, nomeadamente os destinados à franja da população socioeconomicamente mais vulnerável, das politicas setoriais da educação, da saúde, da cultura, do desporto, bem como dos investimentos em equipamentos estruturantes e, por isso, importantes para o concelho de Vila Nova de Gaia.
Contudo, existem temas que são fraturantes e que não acompanhamos pela razão de não se aproximarem do espectro político defendido pelo PAN. Outros, porque consideramos que as medidas implementadas são manifestamente insuficientes para resolver os problemas existentes no município.
Não acompanhamos a completa ausência de políticas de proteção e conservação da natureza e da biodiversidade no concelho. Na verdade, o que se tem vindo a assistir é à depauperação de zonas naturais e a sua capitulação ao “betão e aos grandes projetos”, bem como à sua substituição por zonas de lazer e fruição. Aliás, vem sendo hábito deste executivo confundir natureza com áreas de lazer e fruição. E a fundamentar o que aqui se diz é a diferença abismal da verba afeta a “jardins” com aquela que mais se aproxima do conceito de “conservação da natureza e biodiversidade” que é o Parque Biológico (325.000€) – desta feita o parente pobre da rúbrica.
Não se entende quando se diz no relatório “reabilitar espaços de lazer como o Monte da Virgem”, quando precisamente o que irá verificar-se é um autêntico massacre da massa arbórea e área verde, onde nem zonas classificadas/protegidas serão poupadas. Se existe ainda um local, em tecido urbano, com alguma biodiversidade é aquele, mas que irá desaparecer a breve trecho. O grande pulmão que irá sucumbir às muito duvidosas opções técnicas que permitiram a composição do Metro circular em trincheira naquele local, bem como o surgimento de um parque de materiais e oficinas que nunca deveria ter lugar na zona escolhida. A tudo isto acresce o projeto para um novo mega santuário da confraria do Monte da Virgem. As opções são claras, vivemos e comemos betão, cimento e urbanismo, como se isso fosse a chave da nossa sobrevivência. Também não se entendemos o tratamento e a manutenção que prolifera neste município com podas desastrosas e desprovidas de qualquer saber fazer.
Pela 4.º vez consecutiva vem o executivo proclamar o fim do uso do glifosato. Será que é desta? Também não se vislumbra qualquer medida ou intenção tendente a mitigar a enorme poluição existente no rio Douro.
Não acompanhamos as medidas que têm a ver com a proteção da orla costeira, nomeadamente com a inclusão no projeto para o Portinho da Aguda, de uma nova marina para embarcações de recreio, mas também com a eventual ampliação e/ou construção de um pontão – a construção destas estruturas está hoje longe de ser consensual e a longo prazo revelam-se não ser um meio de proteção à erosão da orla marítima.
Não vemos, de igual modo, nenhuma medida no orçamento, seja de desoneração fiscal ou outra, tendente a atrair e a fixar no território empresas sustentáveis e amigas do ambiente. Mas em áreas tão importantes como inclusão social também não vemos nada de novo. Não obstante a aprovação, nesta Assembleia, de uma recomendação apresentada pelo PAN a 11 de abril de 2019, nada consta neste Orçamento sobre o Alargamento da Rede Especialista de Intervenção com Vítimas da Violência à população LGBTI+. Tema este de grande importância, ainda mais sabendo que o mesmo abrange sobretudo crianças, adolescentes e jovens. Situações já de si graves e que se agudizam em tempos epidémicos como os que vivemos e iremos, seguramente, viver de forma reiterada no futuro.
Quanto à temática da proteção, saúde e bem-estar animal, a verdade é que ficamos surpreendidos, mais uma vez, quando o executivo considera que o trabalho realizado nesta área foi, e passo a citar “absolutamente ímpar e marcante na nossa comunidade.”, autointitulando-se um concelho amigo dos animais. Comparemos, em termos globais, a verba atribuída à causa animal – 362.970€ -, com a verba afeta à construção de um único parque temático – 426.000€. Assim, parece-nos que este orçamento é mais amigo do “Pinóquio” do que dos animais. Com o devido respeito, as medidas até hoje implementadas não resolvem em nada os verdadeiros e graves problemas que existem no município nesta matéria. Senão vejamos:
- O novo CROA, com o qual, evidentemente, nos congratulamos, sem dúvida que irá oferecer melhores infraestruturas que possam servir de “quartel general” aos serviços municipais e de parceria que atuam neste contexto;
- Dizer que o trabalho realizado é ímpar e marcante, só porque se construiu um novo CROA e se realizam algumas feiras de adoção por ano, denota um total desconhecimento do que se passa no nosso município em termos de proteção animal;
- Ímpar e marcante é o trabalho que dezenas de cidadãos e cidadãs continuam a fazer no terreno, às suas custas e sem qualquer ajuda da Câmara Municipal. Não fosse o trabalho destes anónimos munícipes, Gaia estaria bem pior.
Na realidade:
- as colónias de gatos continuam descontroladas e a crescer – apesar de o PAN ter já apresentado duas recomendações neste sentido, foram as duas sucessivamente chumbadas;
- as matilhas são cada vez em maior número e cada vez mais agressivas;
- as famílias de acolhimento continuam a ser ignoradas;
- o programa CED não existe;
- o apoio a famílias com carências socioeconómicas na esterilização dos animais continua a não existir;
- em face do número crescente de abandonos, não existe qualquer reforço de campanhas de prevenção e de sensibilização à esterilização;
- a inexistência de parques caninos – espaços que têm por objetivo permitir aos animais de companhia correrem e brincarem livremente, de acordo com regras estabelecidas, mas sem as restrições normais obrigatórias, como o uso de trela e açaime;
- inexistência de um serviço de atendimento de urgência e de recolha de animais errantes feridos em horário pós-laboral e fins de semana.
A toda esta emergência, decide o Executivo, segundo as notícias da imprensa, gastar 165.000 num projeto social de interação entre a população prisional e os animais de companhia. Se, porventura, algo de bom se poderá retirar daqui – muitas questões se colocam – a verdade é que existem a montante, tal como se acabou de elencar, um infindável número de situações que carecem de intervenção urgente. Este executivo continua com a “costela” do show-off,a qual nesta matéria não resolve qualquer problema que urge ser resolvido.
Pelo exposto, e concluindo, consideramos que este orçamento não denota nem reflete em si um conjunto de preocupações que consideramos estruturantes e, por isso, fundamentais para uma Vila Nova de Gaia humanista, compassiva, amiga dos animais e ambientalmente sustentável. Tendo em conta aquilo em que nos revemos no presente orçamento para 2021, mas também tudo aquilo com o qual não concordamos ou não vemos previsto neste documento, e porque efetivamente cumprimos o que veiculamos na campanha eleitoral, não podemos continuar a apoiar um orçamento com tantas omissões em áreas fulcrais como a responsabilidade com as gerações futuras, o ambiente/biodiversidade e a proteção animal.
Assim, a nossa posição será não acompanhar a proposta de Orçamento e Opções do Plano para o Município de Vila Nova de Gaia.
Intervenção de Pedro Ribeiro de Castro na discussão do Orçamento Municipal do Porto para 2021, 3 de dezembro de 2020