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Recomendação -Criação de uma Equipa Municipal de Salvação e Resgate Animal

Recomendação -Criação de uma Equipa Municipal de Salvação e Resgate Animal

Considerando que:

Os municípios e as freguesias dispõem de atribuições e competências próprias, definidas no Regime Jurídico das Autarquias Locais constante da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, em domínios que se podem sobrepor, designadamente em matéria de proteção civil.

No que ao município diz respeito, compete concretamente ao Presidente da Câmara Municipal, nos termos da alínea v) do n.º 1 do artigo 35.º do referido diploma, dirigir, em articulação com os organismos da administração pública com competência no domínio da proteção civil, o serviço municipal de proteção civil, tendo em vista o cumprimento dos planos de emergência e programas estabelecidos e a coordenação das atividades a desenvolver naquele âmbito, designadamente em operações de socorro e assistência na iminência ou ocorrência de acidente grave ou catástrofe.

Nos termos da Lei n.º 27/2006, de 3 de julho, na redação dada através da Lei n.º 80/2015, de 3 de agosto, que aprovou as Bases da Proteção Civil, esta é a atividade desenvolvida pelo Estado, pelas regiões autónomas e autarquias locais, pelos cidadãos e por todas as entidades públicas e privadas com a finalidade de prevenir riscos coletivos inerentes a situações de acidente grave ou catástrofe, de atenuar os seus efeitos e proteger e socorrer as pessoas e bens em perigo quando aquelas situações ocorram.

Para além das ações do quotidiano em matéria de proteção civil em contexto urbano e das políticas de ordenamento do território e de gestão florestal dos últimos anos, em face das alterações climáticas o nosso país tem assistido a episódios devastadores em matéria de incêndios, que têm colocado em perigo não apenas pessoas e bens, mas também animais de companhia, de pecuária e animais selvagens.

Num passado recente, concretamente em 2017, nos fogos de Pedrógão Grande e mais tarde na região centro, morreram mais de 500 mil animais; em 2018, em Monchique, num incêndio que alastrou aos concelhos de Portimão, Odemira e Silves, morreram mais de 1.500 animais de pecuária, perto de 100 animais de companhia e um número incalculável de animais selvagens.

Mais recentemente, no dia 18 de julho de 2020, em Santo Tirso, numa “crónica de uma morte anunciada”, em dois abrigos ilegais que eram conhecidos das autoridades locais e da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), nos quais deflagrou um incêndio e cujo desfecho infelizmente se conhece, estima-se que morreram mais de uma centena de animais de companhia, para além de um outro incêndio que deflagrou dias mais tarde em Viseu e que provocou a morte de cerca de 20 000 pintos num aviário.

Este extenso histórico de acontecimentos trágicos a envolver animais em situações de catástrofe veio demonstrar não só a recorrente incapacidade do Estado no que toca à prevenção de incêndios, mas igualmente a descoordenação das entidades competentes quanto à capacidade de resposta em situação de auxílio e de salvamento às vítimas.

No caso em concreto de Santo Tirso, e não obstante a deslocação de muitas dezenas de pessoas ao local para ajudar a salvar os animais – associações de proteção animal, profissionais de primeiros socorros e de médicos veterinários, entre outras – foi-lhes negado o acesso, impossibilitando-as não só de proceder ao salvamento como de prestar o devido auxílio, tendo os animais sobrevivos permanecido no local quase 24 horas sem qualquer apoio até que cerca de uma centena de pessoas conseguiu entrar nos abrigos para resgatar os animais.

Também em Lisboa tiveram lugar catástrofes e outras situações que implicaram a necessidade urgente de auxílio a animais, designadamente incêndios e derrocadas de edifícios, nos quais os animais ficaram presos sob os escombros, a par de outras ações do quotidiano que requerem a articulação com entidades como a Proteção Civil para o socorro e resgate de animais, torna-se necessário reforçar a prevenção de riscos.

Na cidade de Lisboa existem locais com um elevado número de animais, como é o caso de associações de proteção animal, da Casa dos Animais de Lisboa, o LXCras, vários hotéis para animais de companhia, nomeadamente dois de grandes dimensões no Parque Florestal de Monsanto, bem como o Jardim Zoológico e o Oceanário, a par de diversos estabelecimentos comerciais que alojam animais, para os quais é necessário existir um plano e uma equipa especializada e multidisciplinar para dar resposta em casos de emergência.

O PAN tem lutado pela inclusão dos animais nos diferentes Planos de Emergência, Contingência e Proteção Civil, através do desenvolvimento de planos setoriais de veterinária. O Grupo Municipal de Lisboa apresentou, em sede de Propostas para as Grandes Opções do Plano para a Cidade de Lisboa 2019-2022 e para os Orçamentos de 2019 e 2021[1], propostas relativamente a esta matéria, nomeadamente:

– Criação do Plano Setorial de Veterinária no Plano de Emergência de Proteção Civil Municipal, que incluísse entre outras situações: o resgate e a evacuação de animais para que, após triagem, pudessem receber tratamento ou ser eutanasiados;

– Estruturação de equipas de salvação e resgate animal inseridas na Proteção Civil, as quais deveriam incluir médica/os veterinária/os.

Ora, nos termos do artigo 40.º da referida Lei de Bases da Proteção Civil, em cada município existe uma comissão de proteção civil, cujas competências são as previstas para as comissões distritais adequadas à realidade e dimensão do município, sendo o presidente da câmara municipal que preside à mesma, como autoridade municipal de proteção civil, podendo ainda a referida comissão, nos termos do artigo 43.º do mesmo diploma legal, determinar a existência de unidades locais de proteção civil, respetiva constituição e tarefas.

A Provedoria dos Animais de Lisboa recomendou à Câmara Municipal de Lisboa, em 2015, que a mesma incluísse a proteção animal nos Planos de Prevenção e Emergência Municipais, para que, em caso de intempéries, fosse previsto o realojamento das pessoas com os seus animais de companhia. Também em 2018 foi realizada a primeira reunião de trabalho para a elaboração do Plano de Atuação em Situações de Emergência para os Animais de Lisboa, o qual contou com a participação da Provedoria dos Animais, do pelouro da Proteção Civil e de forças de segurança.

No Plano Municipal de Emergência de Proteção Civil de Lisboa (PMEPCL) em vigor[2], o qual define as orientações relativamente ao modo de atuação dos vários organismos, serviços e estruturas a empenhar em operações de proteção civil no concelho de Lisboa, está previsto em matéria de atuação sobre animais, entre outras: assegurar ações de busca, salvamento e transporte de animais a cargo dos corpos de bombeiros; prestação de apoio a animais domésticos desalojados por fuga ou por morte dos donos pela Faculdade de Medicina Veterinária, em articulação com os serviços municipais de veterinária; ou ainda ao nível da inspeção e controlo das instalações provisórias de alojamento de animais recolhidos, a cargo da Direção Municipal da Estrutura Verde, Ambiente e Energia. Contudo, não existe uma ação concertada e coordenada, antes dispersa por vários órgãos e entidades de distintas pessoas coletivas, quando seria mais eficaz a existência de equipas especializadas nesta área.

Conforme vem referido no ponto 4.8 do Plano, estima-se que, à semelhança do resto do país, metade dos lares lisboetas possuam pelo menos um animal de estimação, contando ainda a cidade com dois parques zoológicos licenciados (Jardim Zoológico e de Aclimação em Portugal, S.A e Oceanário, S.A), havendo também muitos espaços públicos com animais diversos (pavões, peixes, patos e outros), pelo que em situação de catástrofe a proliferação de animais errantes será uma inevitabilidade, sendo que o atual referido plano municipal de emergência não contempla as vertentes Veterinária de Emergência.

Do mesmo modo, e nos termos do Plano, à Comissão Municipal de Proteção Civil compete-lhe assegurar que todos os agentes, entidades e organismos de âmbito municipal, imprescindíveis às operações de proteção civil, se articulem entre si, garantindo os meios – humanos e materiais – adequados à gestão da ocorrência.

Deste modo, e em face da constatação de facto de que não se poderá continuar mais a ignorar a ponderação das vidas animais em situações de acidente grave ou de catástrofe, o que é aliás uma exigência da sociedade civil conforme se constatou nos episódios trágicos de Santo Tirso, vem o Grupo Municipal do PAN propor que a Assembleia Municipal de Lisboa, na sua Sessão de 15 de junho de 2021, delibere recomendar à Câmara Municipal de Lisboa, ao abrigo do disposto na alínea c) do artigo 15.º conjugado com o n.º 3 do artigo 71.º ambos do Regimento, a introdução de uma alteração no Plano Municipal de Emergência de Proteção Civil de Lisboa, com os seguintes objetivos:

  1. Introdução do Plano Setorial de Veterinária no Plano de Emergência de Proteção Civil Municipal, prevendo, entre outras situações: a articulação das matérias relacionadas com o bem-estar animal e segurança em caso de resposta ou na iminência de um acidente grave e/ou catástrofes na área do Município de Lisboa, nomeadamente o resgate e a evacuação de animais para que, após triagem, possam ser socorridos e sempre que necessário receber tratamento médico-veterinário; o alojamento temporário em estruturas de apoio previamente montadas, com equipas e condições multidisciplinares capazes de proteger o bem-estar animal enquanto estes estiverem deslocados; e, ainda, a criação ou adaptação de um sistema de procura de detentoras/es;
  2. Criação de uma equipa de salvação e resgate animal municipal, cuja composição deverá integrar vários elementos, de entre os quais: licenciados em Medicina Veterinária com inscrição como membro efetivo na Ordem dos Médicos Veterinários, licenciados em Engenharia Zootécnica, licenciados em enfermagem veterinária, para além de outros especialistas cuja participação seja considerada relevante, os quais deverão ser designados pela Comissão Municipal de Proteção Civil e pela Casa dos Animais de Lisboa.

Lisboa, 11 de junho de 2021.

O Grupo Municipal
do Pessoas – Animais – Natureza

Miguel Santos – Inês de Sousa Real


[1]https://www.pan.com.pt/files/uploads/2020/11/Propostas-para-o-Or%C3%A7amento-de-2021-da-Cidade-de-Lisboa_Grupo-Municipal-do-PAN-2.pdf

[2] Aprovado através da Deliberação n.º 458/AML/2018, de 30 de outubro e publicada no 5º Suplemento ao BM nº 1290