Considerando que:
- Através da Lei n.º 56/2012, de 8 de novembro, que procedeu à reorganização administrativa de Lisboa pretendeu-se concretizar os princípios da descentralização administrativa e da subsidiariedade, através de um modelo específico de distribuição de tarefas e responsabilidades entre os órgãos municipais e das freguesias, a fim de o prosseguir com racionalidade, eficácia e proximidade aos cidadãos.
- Nos termos da alínea a) do artigo 12.º do referido diploma legal, é da competência das juntas de freguesia “gerir e assegurar a manutenção de espaços verdes”, cabendo-lhes concretamente proceder às tarefas de gestão e manutenção do arvoredo, incluindo a poda, o abate e a remoção de cepos nos espaços sob sua gestão, mantendo-se na esfera da gestão municipal as árvores integradas nos espaços considerados de natureza estruturante para a cidade, identificados pela câmara municipal sob proposta fundamentada e submetida à aprovação da assembleia municipal, nos termos do seu artigo 13.º.
- Com efeito, através Deliberação 6/AML/2014, de 21 de janeiro de 2014, publicada no Boletim Municipal, edição especial n.º 1, de 22 de janeiro de 2014, ficaram definidos, os espaços verdes de natureza estruturante, cuja gestão e manutenção continuou a ser assegurada pela Câmara Municipal, passando os restantes para a esfera das freguesias, apesar de não se poder ignorar que diferentes critérios em matérias como a poda ou o abate de árvores são sempre alvo de polémica, quer sejam de iniciativa do município, quer das freguesias.
- Passando agora à análise das disposições normativas aplicáveis a esta matéria, nos termos do artigo 2.º do Regulamento Municipal do Arvoredo, publicado no Diário da República n.º 231/2017, Série II de 2017-11-30[1], este tem por objetivo estabelecer normas disciplinadoras do planeamento, implantação, gestão e manutenção do património arbóreo do Concelho de Lisboa, abrangendo as árvores ou arbustos existentes em espaços municipais e bem assim as árvores ou conjuntos arbóreos com regime especial de proteção, situados em terrenos públicos ou privados.
- Do mesmo modo e nos termos do artigo 4.º do mesmo regulamento, todas as árvores existentes no concelho são por princípio consideradas elementos de importância ecológica e ambiental a preservar, devendo para tal serem tomadas as necessárias medidas que acautelem a sua proteção, pelo que e de acordo com o seu n.º 6, ressalvados os casos de abate de árvores, sempre que haja necessidade de uma intervenção que implique o abate, transplante, ou outra operação que de algum modo fragilize as árvores, esta deverá ser previamente sujeita a Parecer da Câmara Municipal ou da Junta de Freguesia, consoante o caso, de forma a determinar os estudos a realizar, medidas cautelares e modo de execução dos trabalhos.
- Sobre esta matéria não podemos também deixar de referir os preceitos constitucionais que estabelecem como tarefas fundamentais do Estado defender a natureza e o ambiente, preservar os recursos naturais e assegurar um correto ordenamento do território, tendo todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado.
- No mesmo sentido a Lei n.º 19/2014, de 14 de abril, que define as bases da política de ambiente, em cumprimento do disposto nos artigos 9.º e 66.º da Constituição da República Portuguesa, assegura que todos têm direito ao ambiente e à qualidade de vida, nos termos constitucional e internacionalmente estabelecidos, bem como o poder de exigir de entidades públicas e privadas o cumprimento dos deveres e das obrigações, em matéria ambiental, a que se encontram vinculadas nos termos da lei e do direito e sendo o arvoredo por si uma parte fundamental do ecossistema da cidade de Lisboa, contribui para a qualidade de vida humana e para a preservação da biodiversidade ao acolher diferentes espécies, sendo como tal objeto de proteção legal.
- Assim, não podemos ignorar que, os espaços verdes em contexto urbano desempenham múltiplas funções, designadamente em matéria de preservação da biodiversidade, para amenizar os extremos climáticos, promovendo a redução de riscos para a saúde pública resultantes das cada vez mais frequentes ondas de calor, como forma de captação de CO2, para além de proporcionarem locais de abrigo, de nidificação e alimentação (pólen, frutos, sementes e invertebrados) para inúmeras espécies animais, incluindo aves e insetos polinizadores, a par da importância da folhagem na restituição da matéria orgânica e de nutrientes ao solo.
- No entanto aquilo a que temos assistido ao longo dos anos, é a uma prática recorrente de podas excessivas, de abate de árvores adultas algumas das quais centenárias, únicas e saudáveis e de elevado valor ecológico e ambiental, as quais já deram inclusive origem a uma petição nesta Assembleia municipal, concretamente à Petição n.º 7/2020[2], da qual saiu a Recomendação n.º 133/02 (4.ª CP) – Resultante do Relatório da 4.ª Comissão Permanente aprovada em plenário, e da qual se deliberou recomendar à CML o seguinte:
«1 – Qualquer decisão sobre o abate de árvores seja tomada com base em estudos ou relatórios técnicos elaborados por instituição pública autónoma, como, por exemplo, o Laboratório de Patologia Vegetal do Instituto Superior de Agronomia, que avaliem o real e efetivo risco de problemas estruturais ou fitossanitários;
2 – Cumpra o estipulado no Regulamento Municipal do Arvoredo em vigor, pugnando para que os projetos de requalificação do espaço público integrem e respeitem o património arbóreo existente, não permitindo qualquer abate indiscriminado.»
- Neste contexto, a importância do planeamento e execução continuada dos restantes trabalhos de manutenção do arvoredo previstos no Regulamento Municipal do Arvoredo à luz Regime Jurídico de Gestão do Arvoredo Urbano, Lei nº 59/2021, de 18 de agosto, como o controlo fitossanitário, a limpeza e remoção de resíduos e a aplicação de tratamentos adequados que, na maior parte dos casos, podem resolver as patologias existentes e prolongar a vida da árvore de forma segura para pessoas e bens, são preteridos em relação a ciclos de podas e abate. As árvores maduras, mais do que as jovens, têm grande capacidade em filtram o ar de impurezas, bactérias e vírus, garantindo benefícios vários para a qualidade do ar que respiramos e do ambiente urbano.
- Temos ainda a agravante de o abate de árvores ocorrer inclusive durante o período de nidificação das aves, quando uma qualquer decisão de abate apenas deveria ser tomada para além de acompanhada dos respetivos relatórios técnicos, após uma ponderada avaliação do efetivo e real risco em relação aos problemas estruturais detetados, que justificasse uma medida tão drástica ao invés de um
aeventual tratamento cuidado, de modo a preservar acima de tudo o incomensurável valor patrimonial que cada árvore representa por si.
- Em muitos casos é também eliminada a vegetação arbórea ou arbustiva que tem um papel importante para prevenir derrocadas e aluimentos de terras ao reduzir a erosão e aumentar a permeabilidade e infiltração de água no solo, evitando ou limitando as cheias repentinas por precipitação. Simultaneamente, não vemos reconhecido o impacto positivo no nosso bem-estar de espaços públicos verdes e paisagens com espécies arbóreas diversas.
- Com efeito e ao longo dos mandatos do PAN nesta Assembleia Municipal, têm-nos feito chegar diversas denúncias de munícipes e da Plataforma Em Defesa das Árvores, dando conta de diversos abates de árvores na cidade de Lisboa, designadamente de árvores adultas e saudáveis (entre elas choupos, freixos, plátanos e rubíneas), de árvores de grande importância ecológica e patrimonial ou ainda de abates de exemplares adultos em plena época de nidificação, conforme já acima se disse.
- A par da situação descrita, julgamos existir ainda outro problema que se prende com a aplicação do regulamento, em concreto com o seu acompanhamento e fiscalização por parte das autoridades, concretamente pela Polícia Municipal e pela PSP, revelando desconhecimento aquando de denúncias efetuadas sobre podas ou abates em terrenos privados, e em particular sobre a sua eventual integração na prática de atos proibidos passíveis de ser qualificados como contraordenações nos termos do Regulamento Municipal do Arvoredo.
Em face do exposto, vem o Grupo Municipal do PAN propor que a Assembleia Municipal de Lisboa, na sua Sessão Ordinária de 25 de junho 2024, delibere recomendar à Câmara Municipal de Lisboa, ao abrigo do disposto na alínea c) do artigo 15.º conjugado com o n.º 3 do artigo 71.º ambos do Regimento:
- Que seja introduzida uma alteração à redação do n.º 2 do artigo 8.º do Regulamento Municipal do Arvoredo, referente à autorização para abate de árvore, abrangendo inclusivamente as situações previstas no artigo 25.º de abate urgente de árvores, nos termos do qual a autorização para abate de árvore apenas pode ser concedida quando e para além de acompanhada de estudos ou relatórios técnicos que concluam nesse sentido, seja efetuada uma avaliação caso a caso sobre o afetivo risco de problemas estruturais ou fitossanitários identificados, que justifiquem uma medida tão drástica de abate ao invés da opção por uma poda adequada.
- Que se efetuem avaliações fitossanitárias com regularidade de forma a evitar que sejam executados quaisquer trabalhos de poda, abate, ou de remoção de cepos durante o período de nidificação das aves.
- Que seja intensificada a formação jurídica dos agentes da Polícia Municipal que asseguram a fiscalização das disposições do presente regulamento.
- Que seja revisto o atual Regulamento Municipal do Arvoredo de acordo com as evidências científicas atuais e adequado ao período de atuações climáticas em que vivemos e que compreenda a participação pública.
- Que em sede de revisão do Regulamento Municipal do Arvoredo, seja tendente à criação mecanismos de monitorização e fiscalização por parte da Câmara Municipal de Lisboa.
Lisboa, 25 de junho de 2024
O Grupo Municipal
do Pessoas – Animais – Natureza
António Morgado (DM PAN)
[1] https://dre.pt/home/-/dre/114290144/details/maximized
[2] https://www.am-lisboa.pt/302000/1/015411,000420/index.htm