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A Insustentável leveza do silêncio

Há um ditado popular que diz “A palavra é de prata, o silêncio é de ouro” e há momentos na vida política em que não poderia ser mais verdadeira esta acepção.


Contudo, o silêncio é, muitas vezes, visto como uma fraqueza pela ausência de resposta, mas é, na realidade, uma força produtiva. Digamos que é quase uma espécie de super-poder.


Nos dias que correm, no campo da política, saber estar calado é uma arte, sendo muito poucos os verdadeiros artistas que sabem ter a elegância de não cair em declarações fúteis e desprovidas de qualquer bom senso. Se a liberdade de expressão é um direito inquestionável em qualquer democracia, o direito a não ripostar ou a desvalorização face aos comentários produzidos representa uma conquista de que não devemos abdicar e até usar e abusar sempre que necessário. Mas isso nem sempre acontece.


O que ocorreu a semana passada com as declarações do Senhor Vice-Presidente do Governo Regional acerca da postura dos médicos da Região em geral e aos que prestam serviço no Hospital Divino Espírito Santo em particular, foi uma espécie de falta de elegância para estar calado. Uma falha no super-poder.


Mas o Vice-Presidente foi ainda mais longe e “metendo a foice em ceara alheia”, atropelou as competências da tutela da saúde bem como, ao invés de deixar a conciliação e a negociação para o problema dos médicos relativamente ao regime das horas extraordinárias a quem de si competia,
fez cair um embaraço sobre si mesmo.


Em resposta à incapacidade de não estar calado, mais de 400 médicos assinaram um memorando, repudiando as declarações da segunda figura do Governo Regional e recusando a realização do trabalho extra, independentemente da remuneração. Conseguiu, ainda, a proeza de fazer girar a atenção do Bastonário da Ordem dos Médicos na direção dos Açores e sobre si mesmo pelos piores motivos.


Mais, os médicos pedem agora, que Artur Lima se retrate e, agora sim, que use da palavra e responda.


Se para alguns partidos esta situação é uma aposta para inflamar a questão e as conversações entre
os agentes interessados, para o PAN/Açores manifesta-se num fruto amargo daquela que foi a iniciativa que deu luz à intenção de remunerar as horas extraordinárias médicas da forma mais condigna.


O documento aprovado em outubro em Plenário não traduz, de forma alguma, as intenções do partido nem o Projecto de Resolução apresentado, votado e aprovado. Limitar as horas a um tecto máximo é a total inversão da gestão dos recursos nos serviços de urgência das Unidades de Saúde e Hospitais.


De facto, durante a última década vem-se assistindo a uma desnatação preocupante do SNS como consequência dos baixos salários médicos, congelamentos remuneratórios e estagnação das carreiras, más condições físicas e tecnológicas das instituições e excessiva carga de trabalho e de todos estes problemas sofrem os utentes dos Açores.

O objectivo de poder oferecer aos médicos uma remuneração melhor e não deixar os utentes sem
assistência corre o risco de cair por terra e a real intenção, que era contrair a despesa com contratados ou os chamados tarefeiros, poderá mesmo ser a consequência que se desejava evitar.


Perante as dificuldades acrescidas, cabia ao Vice-Presidente agora retractar-se perante os profissionais da irresistível tentação de falar quando não era momento e aproveitar a oportunidade para, também enquanto profissional da saúde, reconstruir a ponte que quebrou.


Estando este Governo cativo de uma coligação e influências mal distribuídas, não irá, decerto, admitir este atropelo de funções, mas antes legitimá-lo para evitar constrangimentos internos e não se avizinha, provavelmente, qualquer pedido de desculpas aos médicos.


Resta-nos esperar e observar quem aguenta ficar calado mais tempo.