Este mês celebrou-se o Dia Mundial da Saúde. Os desafios nesta área para o século XXI são enormes, mas num futuro imediato a agenda para a saúde deve focar-se em pelo menos alguns aspectos mais relevantes, entre os quais salientaríamos as catástrofes naturais e humanas, as migrações e as novas doenças transmissíveis e emergentes, as iniquidades e a acessibilidade, a transição digital para uma melhor partilha de informação global e a aplicação da inteligência artificial, a sustentabilidade dos sistemas decorrentes dos custos com o envelhecimento populacional e elevada prevalência de doenças crónicas, dos novos e sofisticados meios de diagnóstico e tratamento e ao mesmo tempo a limitação de recursos, bem como e sobretudo na promoção, na prevenção e na literacia em saúde. Além disso, ao longo do ciclo de vida, desde a concepção ao envelhecimento, cada cidadão tem necessidades diferentes, pelo que será também necessário considerar um novo paradigma na gestão em saúde.
Porém, o tema escolhido nesta comemoração, “O nosso planeta, a nossa saúde”, é extremamente importante pois alerta que a nossa saúde depende igualmente da forma como cuidamos do ambiente, tal como as alterações ao equilíbrio dos ecossistemas influenciam o nosso bem-estar. Existe, pois uma reciprocidade nesta relação. É por isso essencial conjugar a tríade pessoas, animais e natureza para fomentar políticas consistentes ao nível de uma só saúde para todos e colocá-la num plano onde não era antes considerada.
A ONU definiu que os determinantes ambientais são responsáveis por 1 a 4 mortes prematuras no mundo. Distribuiu-os entre dois grupos. Um, os grandes eventos climáticos extremos, responsáveis por doenças agudas, infecções virais e pandémicas, como a Covid-19, e toda a perda ecossistémica e de biodiversidade causada directamente pelos fenómenos decorrentes das alterações climáticas. O outro, estimulante de cronicidade na doença humana, é o das poluições difusas, de tal forma que a Agência Europeia para o Ambiente estima que, por exemplo, 178 000 vidas poderiam ter sido salvas, em 2019, se respirassem um ar mais limpo.
Estes factos prendem-se com aquilo que somos ante as nossas escolhas pessoais ao nível dos padrões actuais de vida: a água que bebemos, os alimentos que ingerimos, os resíduos que produzimos. Estes comportamentos podem conduzir à instalação progressiva de doenças crónicas, como as intoxicações, doenças autoimunes, cancro, obesidade, diabetes e hipertensão, doenças do foro psicológico e neurológico.
Não podemos ter a arrogância de pensar que a poluição, ainda que distante de nós, não nos afectará, pois a sua circularidade está patente no plástico que vemos nas nossas praias ou, como é exemplo, a recente constatação de vestígios de micropartículas plásticas já encontradas no próprio organismo humano.
Acompanhando a visão da OMS, conjugar o verbo “cuidar” da saúde da referida tríade é fundamental para a década que vivemos. É necessário que comunidade global se comprometa em resgatar da sua génese a maior capacidade que desenvolveu desde os primórdios da hominização, o de zelar por si como um todo e por cada um dos seus elementos e do meio envolve.
Sabendo que nem todos os problemas se resolvem com a mera injecção de verbas, é fundamental o empenho em políticas públicas que apostem numa economia de bem-estar e regenerativa. O desafio da economia ambientalista assenta no compromisso organizado entre políticas intra-governamentais, a sociedade civil, o empreendedorismo e um sistema de saúde empenhado na sua missão. Uma economia capaz de se reinventar em prol do bem-estar das gerações vindouras e que tem pela frente o maior desafio de sempre: ser capaz de olhar para a crise do clima como olhou muitas vezes para as crises sanitárias ao longo da história porque efectivamente está demonstrado que elas estão perfeitamente interligadas.