O turismo é estratégico para os Açores, encontra-se em ascensão, tem impacto a nível social, económico, cultural e ambiental e está muito dependente da conduta humana.
Ciente que que o turismo de cruzeiro constitui um sector muito específico impulsionado pela situação geoestratégica da Região, o PAN/Açores apresentou uma iniciativa no Plenário de Julho para implementação de uma ecotaxa marítima aos viajantes dos navios que atracam nos nossos portos. Ao escrever este artigo desconheço o resultado na votação, mas é provável que seja tão fatídico como o da taxa turística.
Face a maio de 2019, as dormidas de não residentes apresentaram nos Açores um crescimento de 21,4%. O segmento dos navios de cruzeiro apresenta uma tendência crescente e as previsões para 2023 são bastante auspiciosas com um aumento de 17% só no primeiro semestre.
Tal crescimento é apoiado pelo Governo, com as recentes obras de dragagem na bacia do porto de Ponta Delgada, a integração da Porto dos Açores na Cruise Lines International Association para fazer dos Açores uma base Atlântica de cruzeiros e cooperar com os maiores operadores do mundo ou investimentos públicos questionáveis como a construção de um cais para navios de cruzeiro na Praia da Vitória
Não temos dúvidas do potencial do turismo para o crescimento do VAB da região (2,9%), mas devemos ponderar se é este tipo de turismo que precisamos e quais os seus pontos fortes e fracos.
Está comprovado que os poluentes atmosféricos que estes navios emitem são causadores de doenças cardiovasculares e respiratórias que levam à morte prematura, contribuindo ainda para a acidificação das chuvas, afectando o equilíbrio dos sistemas ecológicos.
O sector depende quase inteiramente de combustíveis fósseis. Apesar de melhorias decorrentes das normas regulamentares sobre combustíveis marítimos, o resultado fica muito aquém dos aplicáveis a outros modos de transporte. Estabelecendo um paralelismo, um navio de cruzeiro que transporte 2700 passageiros pode produzir uma tonelada de resíduos por dia, assumindo uma pegada de carbono superior a 12 mil automóveis.
Lisboa e Funchal estão, segundo estudo recente, entre as cidades mais poluídas da Europa, valendo a Portugal o sexto lugar nos países mais poluídos com base na emissão de dióxido de enxofre por navios de cruzeiros. Muitos dos navios apontados como os mais poluentes fazem a sua passagem no mar dos Açores e atracam nos nossos portos.
Se realmente desejamos que o turismo seja gerador de receitas provenientes de investimentos de retorno sustentável tal implica uma análise aprofundada do turismo que precisamos. A pegada turística tem de ter um preço que todos deveríamos assumir, quando impomos ao nosso mar, à nossa costa e às nossas cidades uma sobrecarga que poderá gerar um esforço na despesa pública.
A questão é se estamos em condições de cumprir com as exigências e metas que nos serão impostas, enquanto o Governo Regional assume o compromisso de definir o turismo de cruzeiro nos mesmos moldes que Lisboa e Funchal o fizeram e arriscarmo-nos a candidatar uma das nossas cidades a um lugar no ranking das mais poluídas da Europa. Merecem os Açores uma aposta num turismo massivo, de pouco retorno financeiro por passageiro sem qualquer tipo de contrapartida pela pegada que deixa?