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Abolição: os trilhos de uma civilização

Porque ambiciona tanto o PAN/Açores acabar com todas as práticas tauromáquicas?

Desde logo pela defesa do bem-estar animal com fundamentos históricos e científicos e, simultaneamente, com reconversão do sector para evitar iniquidades sociais e estagnação económica. É uma evolução no sentido de fomentar uma economia mais empática.

Desde o fresco de Knossos, passando pelo Labirinto Minotauro, pelos Tetramorfos cristãos, até às gravuras de Foz Côa, constatamos que o touro faz parte da iconografia ligada a simbolismos religiosos e rituais de passagem. O touro é um símbolo de virilidade, um ser mágico, enlaçado num encanto sobrenatural, numa espécie de hierofania que a humanidade manipulou para expressar a sua superioridade face à força da natureza.

A ciência mostrou-nos que touro é um descendente do auroque, ancestral do gado bovino domesticado no Crescente Fértil, onde ocorreram cruzamentos genéticos, por motivos de alimentação e adaptação climática, do gado bovino com o zebuíno.

As castas fundacionais, de onde derivam todos os touros de lide, seleccionaram os animais pelas características comportamentais e morfológicas opostas às dos bovinos criados para consumo de carne ou de leite. Sabemos, contudo, que o touro macho que é lidado vive, em média, apenas 4 anos, enquanto as fêmeas podem passar uma vida inteira em liberdade.

São, portanto, as ganadarias que, através da selecção zootécnica, preservam particularidades morfológicos e comportamentais. Porém, esta selecção, que fomenta a bravura do touro é um conceito de difícil definição e mutável no tempo. Pode dizer-se que o fim da tauromaquia não determina, per si, o fim da raça taurina, mas apenas as características inescusáveis para ser lidada.

A ciência provou-nos que a senciência não é exclusividade de animais humanos. A dor física ou psicológica existe nos animais humanos e não humanos. A Declaração de Cambridge, que incide sobre a consciência, reafirmou que a ausência de neocórtex não obsta estes últimos de experimentarem estados afetivos, abrindo uma nova porta aos direitos dos animais. Se pelo Código Civil os animais deixaram de ser considerados coisas para serem considerados seres dotados de sensibilidade e sujeitos a proteção jurídica, o debate em direcção ao fim da tauromaquia abre-se pela forma como expõe os animais à dor e sofrimento.

A dialéctica histórica concede-nos uma cronologia que suporta a abolição através de olhares mais compassivos e anti-especístas. Em 1911, o Deputado Fernão Boto apresenta, na Assembleia Nacional, uma proposta destinada à abolição da tourada, por ser um “deprimente espectáculo”. Em 1836, a Rainha D. Maria II proíbe as touradas no Reino por serem “divertimento bárbaro”. Em 1821, nas Cortes Constituintes, o Deputado Borges Carneiro apresenta um projeto de lei para a proibição dos espetáculos tauromáquicos, classificando-os como contrários “às luzes do século, e à natureza humana. E a abolição aconteceu em 1809 pelo rei D. João

VI, por serem “Espetáculos quase sempre acompanhados de desastres, no lugar do mesmo espetáculo ou na condução de animais”.

Considerando os factos expostos, porque não há espaço para todos, o PAN/Açores pretende acabar com o sofrimento animal provocado pela tauromaquia, sendo que os motivos subjacentes ultrapassam, de forma expressiva, o mero entusiasmo da afición.