Uma das medidas que a Câmara Municipal de Lisboa decretou no início da pandemia Covid-19 no âmbito do urbanismo foi a de que “Os prazos administrativos a favor dos particulares, nos termos da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, encontram-se suspensos até cessação das medidas excepcionais, tais como, a título de exemplo, audiências prévias, entrega de elementos, entre outros.”[1]
Esta medida entende-se devido à dificuldade sentida por diversas pessoas e empresas para se adaptarem a esta nova realidade, e por se encontrar de acordo com a legislação produzida pelo Governo.
No entanto, ao ser anunciado que as equipas do licenciamento estariam em teletrabalho e que a atividade das equipas se estava a desenvolver de forma regular neste período de contingência, não se compreende que não estejam a ser cumpridos os prazos legais de análise, previstos na legislação em vigor.
É com enorme preocupação que o Grupo Municipal do PAN assiste ao lançamento do programa “Urbanismo Digital”, a adicionar ao programa já existente Geslis, sem a devida articulação/ migração de forma a acautelar a preservação da informação, uma vez que não há informação quanto à migração de os processos entrados nesta plataforma, de forma a ficarem devidamente acautelados os cumprimentos dos prazos de resposta por parte da autarquia aos milhares de munícipes (projetistas, investidores, particulares, etc) que aguardam respostas, que não chegam, relativas aos processos pendentes.
Aliás, a comunicação social[2] deu notícia de vários problemas que surgiram desde o início do plano de contingência, que só vieram agravar anos de queixas relativas a sucessivos atrasos nos processos de licenciamento por parte da autarquia, o que em muito é susceptível de prejudicar particulares e investidores, e em última análise prejudicar a cidade.
Estamos a atravessar uma época extraordinariamente sensível do ponto de vista social e económico, em que existem particulares que compraram habitação e precisam de licenças para começar obras com empréstimos bancários, investidores que precisam também de licenças ou de vistorias para comercializar imóveis, entre tantos outros casos. Desta forma, a cidade necessita, mais do que nunca, de eficiência e eficácia por parte da autarquia, inclusive ao nível da gestão dos processos de licenciamento, não sendo a melhor altura para a apresentação de novos programas que não são prioritários e que não corrigem os erros do passado e do presente existentes no licenciamento.
Citando a própria Câmara Municipal de Lisboa na Estratégia de Reabilitação Urbana 2011-2024: “Do Município exige-se que seja um parceiro ativo e dinamizador do processo, e não um “polícia” que desconfia, íntima, penaliza e se substitui a terceiros. Para isso será necessário: Alterar a percepção de que licenciar uma obra é um processo demorado, difícil e pouco transparente. O Município terá de reduzir os custos de contexto de quem pretende investir na conservação/reabilitação do edificado, tornando os procedimentos de licenciamento desburocratizados, céleres e transparentes”.
Ainda no que concerne ao anúncio de que o Município de Lisboa implementou neste novo pacote de medidas de simplificação no licenciamento urbanístico a simplificação administrativa e controlo meramente formal das especialidades, relembramos que desde a publicação da primeira versão do Decreto-Lei n.º555/99, o qual data 1999, que “As declarações de responsabilidade dos autores dos projectos das especialidades que estejam inscritos em associação pública constituem garantia bastante do cumprimento das normas legais e regulamentares aplicáveis aos projectos, excluindo a sua apreciação prévia pelos serviços municipais, salvo quando as declarações sejam formuladas nos termos do n.º 5 do artigo 10.º” Ou seja, se a Câmara de Lisboa procedia até agora à apreciação das especialidades não o devia fazer, pelo que a pergunta que fica é se fazia a análise dos projetos de especialidades não cumprindo a legislação e agora deixou de o fazer e finalmente passou a cumprir a referida legislação ou meramente decidiu anunciar o que já fazia em cumprimento da legislação.
Quando a autarquia anuncia, paralelamente, o “reforço muito significativo de engenheiros e arquitetos afetos à fiscalização”, e ainda a “Constituição de equipas de missão com recursos humanos e tecnológicos que permitem duplicar a capacidade atual para eliminar a pendência de tramitação de processos na fase de Especialidades e Ocupação de Via Pública” reconhece que há processos atrasados, mas não diz quantos nem quais os motivos, o que também importa questionar.
Face ao exposto, vem o Grupo Municipal do PAN requerer a Vª Exª que se digne, nos termos da alínea g) do artigo 15º do Regimento da Assembleia Municipal de Lisboa, solicitar à Câmara Municipal de Lisboa esclarecimento escrito relativamente às seguintes questões:
– Número de processos analisados e concluídos (com resposta a munícipes) desde que as equipas estão em teletrabalho, tendo em conta a totalidade de processos existentes para despacho e as várias tipologias dos mesmos?
– Quantos emails de reclamação foram recepcionados pelos serviços durante este período referentes a urbanismo e a falta de resposta da CML?
– Quais são os prazos médios, nos últimos seis meses, desde a entrada até ao despacho final, inerentes ao processo de licenciamento e comunicação prévia de vários tipos de obra, como por exemplo: processo de licenciamento de uma obra de alteração de um apartamento inserido num edifício; processo de licenciamento de ampliação de uma moradia; construção nova de um edifício habitacional; entre outros?
– Porque razão optou a autarquia por lançar a nova plataforma durante esta época de crise sanitária, em que se torna mais difícil o acesso dos munícipes aos espaços físicos de atendimento da autarquia, caso exista dificuldade no acesso à mesma?
– Os serviços de licenciamento da autarquia faziam até recentemente a análise dos projetos de especialidades indo contra a legislação em vigor e desde o anúncio da simplificação deixaram de o fazer, passando a cumprir a legislação ou meramente decidiram anunciar o que já fazia em cumprimento da legislação?
– Quantos processos estão neste momento na CML cuja análise está atrasada?
– Como é que reforça a fiscalização com engenheiros e arquitetos e ao mesmo tempo constitui equipas que duplicam a capacidade atual?
– Os funcionários que vieram reforçar o departamento de urbanismo na área do licenciamento são originários de que serviços da CML ou são externos e quantas contratações foram realizadas?
– Que experiência tinham originalmente antes de ingressarem este serviço e que tipo de formação receberam específica em matéria de licenciamento?
Lisboa, 22 de junho de 2020.
O Grupo Municipal
do Pessoas – Animais – Natureza
Miguel Santos – Inês de Sousa Real
[1] https://www.lisboa.pt/covid-19-medidas-e-informacoes/a-cidade/atendimento-municipal#c8114
[2] https://jornaleconomico.sapo.pt/noticias/teletrabalho-agrava-atrasos-na-aprovacao-de-projetos-imobiliarios-na-camara-de-lisboa-574226; https://www.idealista.pt/news/imobiliario/habitacao/2020/03/23/42807-lisboa-e-porto-asseguram-servicos-de-urbanismo; https://www.publico.pt/2020/05/11/local/noticia/camara-lisboa-simplifica-reforca-fiscalizacao-licenciamento-urbanistico-1915967; https://www.idealista.pt/news/imobiliario/habitacao/2019/06/18/39990-camara-de-lisboa-tem-quase-4-000-processos-urbanisticos-em-stand-by; https://www.jornaldenegocios.pt/economia/autarquias/detalhe/medina-cria-equipa-para-recuperar-atrasos-nos-licenciamentos;