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Empurrar o problema com a barriga… 

Na semana passada foram divulgados os dados do Relatório COSI Portugal, que reporta e integra o Childhood Obesity Surveillance Initiative da Organização Mundial de Saúde. Este Relatório procura produzir dados comparáveis entre países europeus e monitorizar o estado nutricional e obesidade infantil, num estudo realizado a cada 3 anos. 

Se já em 2019 os dados eram preocupantes, em 2022 agudizaram-se. Em 2019, a percentagem de crianças entre os 6 e 8 anos com excesso de peso era de 35,9%. Em 2022 atingiu 43% – um aumento de 7 pontos percentuais. Em termos comparativos, a média do país, que também subiu, ronda os 31%. Já os índices de obesidade infantil, que em 2019 se fixava nos 17,9% estão agora nos 22%. A estes dados aliam-se também à deteção de uma redução da proficiência motora. 

A obesidade, reconhecida em Portugal como problema de saúde, tem na sua génese causas multifactoriais. A pandemia foi certamente um factor contribuidor para este aumento generalizado, em todo o país. A alteração de rotinas, o confinamento e a ausência, intermitente e prolongada, do meio-escolar, local onde muitas das crianças conseguiam te ruma refeição completa e variada, produzem agora efeito nestes valores agora divulgados.  

Não se pode, contudo, imputar toda a culpa no período pandémico. Sobretudo quando vimos a ser, consecutivamente, a Região do país com os piores indicadores nesta área, quer nas crianças, quer nos adultos.  E como se reverte isto?  

Através de mudanças estruturais na forma como escolhemos os nossos padrões e comportamentos alimentares e como educamos as futuras gerações para opções alimentares mais saudáveis. Cabe ao poder executivo criar políticas transversais a várias áreas e órgãos governativos para combater esta epidemia.  

Mas se o exemplo, que deve “vir de cima”, incentiva, para satisfazer um lobby instalado, o consumo de productos que estão comprovados como nefastos à saúde humana, muito dificilmente iremos sair deste fosso e conseguir combater este problema de saúde pública.  

Ainda recentemente, aquando das celebrações do Dia Mundial do Leite, o Secretário da Agricultura defendeu que, e passo a citar, “Para além de ser instintivo e natural, tem uma riqueza nutricional indiscutível. Certos de que temos um papel crucial no incentivo de uma alimentação equilibrada, diversificada e saudável, consideramos a ingestão de leite e produtos lácteos um passo essencial para a boa alimentação das crianças, jovens e adultos”. 

Haja estômago para suportar que, em 2023, existam ainda representantes governativos que declaradamente empunham bandeiras destas e profiram alarvidades já desconstruídas há muito pela ciência, fazendo tábua rasa à vasta produção científica desta matéria, em prol e para a sobrevivência de uma indústria que está ligada às máquinas.  

E isto é recorrente! Em Janeiro, quando se discutia em plenário o diploma que regula a organização e o funcionamento das cantinas e bufetes escolares, o PAN apresentou propostas de alteração para  incluir a distribuição gratuita, à semelhança do que já é prática corrente com o leite, de alternativas vegetais aos produtos lácteos nas escolas do 1º ciclo e ainda a distribuição preferencial de frutas frescas e variedades hortícolas provenientes da produção regional, mas foram inconsequentes, tendo sido injustificadamente reprovadas pelos partidos da coligação e que suportam o Governo.   

Continuar a empurrar o problema com a barriga não é solução, mas é o modus operandi deste Governo e dos que lhe dão cobertura.