A carência de habitação tem sido um tema recorrente em Portugal. Intensificou-se nos últimos tempos pela situação económica motivada pela subida da inflação, adicionada à inércia ao nível de políticas públicas para a habitação e sucessivo desajustamento do tema às novas realidades nos eixos programáticos dos governos.
Entre 2011 e 2015, a Euribor caiu cerca de dois pontos, seria expectável que houvesse mais oferta e existisse um aumento da construção para compensar o crescimento da procura que aumentou a partir de 2012. Tal não ocorreu.
Nos últimos anos temos assistido a uma queda abrupta na construção de novas casas. Entre 2000 e 2020, a construção caiu cerca de 85%. Juntando a isto, Portugal foge ao cenário europeu de descida de preços de habitação, pois aumentaram 67% desde 2015. As rendas subiram 18% no mesmo período.
Para agravar o contexto, o Banco Europeu anunciou a subida da taxa de juro que, a curto prazo, extingue o optimismo para o desagravamento da crise de habitação.
Esta crise, contudo, tira do armário os velhos fantasmas de um Portugal desencantado, desigual, com salários médios que não permitem uma recuperação da economia. A Região não foge a este flagelo. Os indicadores mais recentes sobre pobreza e desigualdade económicas mostram que os Açores marcam a maior taxa de desigualdade na distribuição de rendimentos.
37,2% dos portugueses não possuem capacidade para pagar uma semana de férias, por ano, fora de casa. A taxa de sobrecarga das despesas em habitação atinge os 4,4% na Região, mas corresponde à proporção em agregados nos quais a rácio da despesa com habitação e o rendimento disponível é superior a 40%.
Num pequeno exercício podemos escalonar o seguinte panorama para um salário médio da Administração Pública em 2022 de 1269,2E (um docente no 4º escalão tem um salário bruto de 1 276,34E). Se disponibilizar 500 euros para renda, a cerca de 5 euros o m2 por 100 m2, juntando a esta despesa 300 euros mensais do cabaz de compras de bens essenciais no contexto actual de crise e despesas com a habitação, que podem alcançar os 100 euros, depressa percebemos que o direito à habitação como elementar na Constituição não é para todos.
As soluções para o problema da habitação devem ser ponderadas de forma transversal, estabelecendo uma estratégia regional a longo prazo em estreita cooperação com municípios sem esgotar o diálogo na habitação social. É necessário rever os variados programas dispersos, assim como uma legislação fragmentada.
É fundamental abordar soluções para os entraves à construção e reabilitação, diversificar e actualizar modelos de renda apoiada, analisando honestamente o impacto do turismo e da compra de imóveis por proprietários sem domicílio fiscal na região.
Medidas radicais como estabelecer tectos ao arrendamento, limitar aleatoriamente alojamentos turísticos sem a atualização dos planos directores municipais ou obrigar ao arrendamento quem tem casa vazia, muito defendidas por uma esquerda que tem na mira o abate do direito básico à propriedade, são de evitar num estado social que deve fomentar a incitativa privada como motor de desenvolvimento económico.