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O Bom, o Mau e o Vilão – Versão Bazuca

Pedro Neves - Opinião AO

Decorreu esta semana a última ronda de audições no âmbito da Comissão de Inquérito à Operacionalização das Agendas Mobilizadoras, com as principais entidades e figuras intervenientes na gerência e implementação do Plano de Recuperação e Resiliência na região.

O que se anunciava como uma oportunidade irrepetível ao financiamento do tecido empresarial açoriano, associado a projectos de matrizes estratégicas, capazes de promover a inovação, a competitividade e de conferir resiliência económica às empresas açorianas, rapidamente se tornou num verdadeiro imbróglio digno de um cenário do faroeste.

À semelhança da mítica cena em que o Bom, o Mau e o Vilão estão, olhos nos olhos, em suspense, com a arma em riste, prontos a lançar o primeiro tiro, assistimos a um completo apontar de dedos (e de culpa) no decorrer das audições entre as personalidades ouvidas.

Mas, ao contrário do filme realizado por Sergio Leone, considerado um clássico do cinema, apesar do seu “low budget”, as Agendas Mobilizadoras apresentavam-se com um orçamento muito mais significativo – 117 milhões de euros, para ser preciso.

Esta foi a verba definida pelo Governo da República a ser alocada aos Açores, na modalidade de candidaturas de consórcios às Agendas Mobilizadoras, ficando o Governo Regional incumbido da gerência. Por sua vez, o executivo açoriano delegou a competência da seleção e elaboração das três Agendas regionais a duas consultoras especializadas, com sede em território continental, mas em articulação também com as três Câmaras do Comércio e Indústria da região.

No filme de Sérgio Leone, temos as três personagens principais a digladiarem-se numa competição para encontrar uma fortuna em moedas de ouro e enterrada numa campa de um cemitério, em plena guerra civil americana. As personagens vivem numa espécie de simbiose e co-dependência pela procura do tesouro, isto porque o Bom sabe o nome túmulo, mas não sabe em que cemitério fica, e o Mau sabe a localização do cemitério, mas desconhece o nome do túmulo. O Vilão não possui qualquer informação sobre a localização, mas sabendo da existência de um tesouro, junta-se à procura, seguindo os passos dos outros dois.

No remake açoriano, há também faltas e falhas de informação, assentes num modelo comunicacional repleto de assimetrias e incongruências, onde uma das partes diz não saber quem fez as listas, o seu congénere diz que recebeu as listas, mas desconhece quem as distribuiu e por último, temos quem alegue total desvinculação e diga “Que listas?! Não conheço nenhuma lista nem tive qualquer intervenção na criação e distribuição de qualquer lista.”, assumindo-se como forasteiro em todo o processo.

No final desta história, em jeito de “plot twist”, vamos descobrir que a culpa é, afinal, de quem amealhou e enterrou o ouro, provocando em sua consequência todo este alvoroço desenfreado pela sua posse e distribuição. Afinal de contas, se não houvesse PRR, não existiriam Agendas nem a criação de listas e consórcios, evitando-se toda uma trapalhada.

Veremos agora se o novo processo de operacionalização das Agendas Mobilizadoras será conduzido com maior transparência ou haverá outra semelhança cinematográfica, mais propriamente “Os suspeitos do costume”.