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Os idosos não são descartáveis

A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima promoveu um debate, em Ponta Delgada, com o mote ‘Pessoas Idosas Vítimas de Crime e Violência’ – um importante assunto, sobre o qual me debruçarei agora. 

A violência contra idosos é uma realidade alarmante e triste que assola a nossa sociedade atualmente.  

Em 2022, o Gabinete de Apoio à Vítima de Ponta Delgada registou um total de 867 atendimentos, sendo que 393% foram crimes contra as pessoas. O crime de violência doméstica, seja ela física ou psíquica, representa a maior percentagem de entre todos os tipos de crime praticáveis contra as pessoas, com 68,7%. As vítimas são maioritariamente do sexo feminino, sendo que a segunda percentagem mais alta são as vítimas com idades compreendidas entre os 65 ou mais anos, constituindo 12,3% – apenas menos oito pessoas do que a percentagem mais alta. 

Na maioria dos casos, a vítima sofre de violência continuada em contexto familiar, contudo, essa violência ocorre também em instituições de cuidados ou até mesmo nas ruas.  

Muitas vezes, esses abusos são praticados por desrespeito à velhice e pela visão equivocada de que os idosos são frágeis e descartáveis. Noutros casos, podem também contribuir para esta situação fatores socioeconómicos, como a falta de recursos financeiros ou a dependência de terceiros. 

Mas não só crimes à integridade física vitimam os idosos, muitos são também alvo de abusos financeiros e negligência, privando-os de uma vida digna e afetando sua saúde física e emocional. 

As estatísticas mostram que a grande maioria das denúncias são feitas via contacto telefónico, o que demonstra também o constrangimento que é sentido por parte das vítimas ou, em acréscimo, o estado débil em que se encontram, seja pela idade ou pelos abusos sofridos, que não lhes permite se deslocarem aos locais destinados às denúncias ou até mesmo para pedir ajuda. 

Apesar de já se vir a registar uma percentagem considerável de denúncias por iniciativa própria, este é ainda um assunto tabu, que acarreta bastantes constrangimentos e é ainda pouco falado nos dias de hoje. 

Também em Portugal continental o flagelo é semelhante. Entre 2021 e 2022, a APAV apoiou um total de 3.122 pessoas entre os 65 e os 74 anos em situação de violência doméstica continuada, na sua maioria, entre dois a seis anos, e cerca de 50% dessas vítimas não fizeram queixa. 

As consequências da violência contra os idosos são devastadoras. Além do sofrimento físico e emocional que lhes é imposto, esses abusos afetam a autoestima, a confiança e a qualidade de vida, infringindo-lhes traumas nos poucos anos que lhes sobram, para não falar das consequências económicas para a sociedade e os maus indicativos para o país. 

Cabe a todos nós promover a conscientização, educação e sensibilização a todas as faixas etárias, assim como garantir a proteção dos idosos, a punição dos agressores e o apoio às vítimas. 

Além disso, é imprescindível fortalecer os laços familiares e comunitários, incentivando o respeito, a empatia e o cuidado intergeracional. Os idosos devem ser valorizados e incluídos em todas as esferas da sociedade, e ser-lhes permitida uma participação ativa e uma voz na tomada de decisões. 

A violência contra idosos é um problema social grave que exige uma ação imediata. É dever de todos assumir a responsabilidade de combatê-la e garantir que estas pessoas desfrutam de uma vida digna, livre de abusos e violações.