Dezembro é, regra geral, uma época de celebração, esperança e renovação. Contudo, este ano, num giro de ironia digno de um conto de Natal distópico, o trenó das renas chegou com um aroma a glifosato e um sinistro pronúncio de promessas não cumpridas. Se Platão tivesse a infelicidade de presenciar este cenário, provavelmente teria escrito uma nova versão da Alegoria da Caverna, onde a escuridão se transforma em luz e as sombras são a única verdade, que se adensa no cavalgar de um Governo de direita extremada. 

A retórica do progresso e da modernidade cai por terra quando se priorizam paisagens urbanas imaculadas pelo betão a custo de pulmões contaminados, ignorando a ciência em benefício de soluções rápidas e retrógradas, sem prejuízo dos impactes ambientais causados, sobretudo num contexto de crise climática.  

É curioso que, em pleno século XXI, ainda tenhamos de debater a segurança e a saúde pública no que respeita ao uso de substâncias tão nocivas quanto o glifosato, amplamente reconhecido pelos seus perigos para a saúde pública e meio ambiente, e, inclusive, classificado como “provavelmente cancerígeno para humanos”, pela OMS.  

Na lista de desejos concedidos consta também o Parque Natural da Caloura, que passou a figurar no inventário de Áreas Marinhas Protegidas q.b, num convite à exploração e ao descaso ao ser permitida a pesca lúdica apeada neste local, proposta pelo Clube dos Cinco Deputados-muleta da Coligação que suportam um governo?coxo?de?maioria, num presságio da trágica história de?Pedro?e?Inês. 

Se as tendências atuais persistirem, as Áreas Marinhas Protegidas não serão mais do que esboços desenhados num mapa que se rege por um diploma que prevê um aumento de 30% destas áreas, e que, pese embora ainda em fase de implementação, já prevê exceções que irão comprometer a sua eficácia quanto ao impacto real na proteção dos nossos santuários marinhos, transformando-os num parque de diversões de torneios de pesca. 

Estamos perante, portanto, um Natal à moda antiga, onde se valoriza o imediato em detrimento do futuro, sob o lema “destruir para (des)construir”, numa capitulação vergonhosa a pressões em nome de interesses económicos de curto-prazismo e assentos garantidos, numa lógica que se esvai como água entre os dedos. 

Em última análise, a atual conjuntura não é mais do que o reflexo de uma política míope e irresponsável, num presságio sombrio para 2025, sufocado pelo glifosato, numa constante tentativa infrutífera de emergir da caverna e abraçar a luz da consciência ambiental.