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A arte de orçamentar

Foi esta semana aprovado na generalidade o segundo orçamento de estado apresentado pelo Governo da República este ano. Os dois orçamentos distanciam-se por um hiato temporal de seis meses, suficiente para gerar significativas alterações nos mercados e na economia mundial.  

Este orçamento surge imbuído num momento de incertezas e perante uma conjuntura volátil, com uma crise económica, energética e ambiental como pano de fundo, mas foi, aparentemente, construído com prognósticos positivos face ao crescimento económico previsto para 2023.  

Para os Açores, coube-nos, ao abrigo da Lei das Finanças das Regiões Autónomas e do Fundo do Coesão para as Regiões Ultraperiféricas, cerca de 288 milhões de euros.  

Este Orçamento demonstra uma vez mais que os Governos da República cumprem apenas os “mínimos olímpicos” com a nossa região. A alocação da verba inscrita para cumprimento das obrigações de serviço público pauta-se pelo elegível por lei, desconsiderando em grande parte o cenário macroeconómico global que também nos afecta.  

Mais, significativa parte do investimento designado para os Açores resulta de intenções/obrigações que já haviam sido anunciadas, mas que, como é apanágio, não tiveram até ao momento qualquer resultado prático.  

O processo de substituição do actual sistema de comunicação eletrónica entre o continente e os Açores é um desses exemplos flagrantes da delonga e arresto temporal na execução das intenções do Governo da República, e apenas se iniciará agora a sua materialização perante o risco de ficarem, num futuro muito próximo, obsoletos. 

E à substituição dos cabos submarinos somam-se muitas mais intenções que, apesar de anos de promessas, permanecem no esquecimento ou no fim de linha da ordem de prioridades do Governo central.  

Pode até parecer, por este discurso, que andamos sempre de mão estendida à República, mas trata-se efectivamente de uma obrigação do Governo central para com a nossa região. Uma região que confere uma importantíssima posição geoestratégica e também agrega significativa receita aos cofres do Estado.  

Já no que respeita ao Orçamento Regional para 2023, e ainda que tenhamos somente a anteproposta como documento base, já foi anunciado pelo Secretário Regional do Ambiente que o cabimento orçamental para a sua secretaria atingirá os 32,2 milhões de euros, regozijando-se que este será um dos maiores planos de investimento de sempre nesta área.  

Esquece-se, todavia, o Senhor Secretário de que apesar desta ser uma verba dirigida à sua secretaria, pouco tem de medidas verdadeiramente ambientais, quando grande fatia desse bolo de investimento (13,4 milhões €), será canalizado para a realização de obras públicas, sendo a obra principal a de requalificação do miradouro da Lagoa do Fogo. 

Quando mais de 41% do orçamento da Secretaria que “tem como missão garantir a manutenção da qualidade ambiental, a conservação da natureza, a proteção dos ecossistemas, bem como a gestão dos recursos hídricos e um eficiente ordenamento do território” é dirigido para a realização de obras, esta mais parece ser uma subpasta da Secretaria das Infraestruturas e deixa de ser consentânea com a sua real matriz e propósito.  

Temos assim esta arte de orçamentar no país à beira-mar plantado e na região nele envolta.