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Moção: Pelo apoio do Governo aos municípios para a adoção de programas e/ou pela criação de parcerias que assegurem o bem-estar dos animais detidos por pessoas carenciadas ou em situação de manifesta vulnerabilidade

Moção: Pelo apoio do Governo aos municípios para a adoção de programas e/ou pela criação de parcerias que assegurem o bem-estar dos animais detidos por pessoas carenciadas ou em situação de manifesta vulnerabilidade

Compete às autarquias zelar pelo bem-estar dos animais nas áreas do seu município, bem como garantir no que se refere a animais errantes a sua captura e tratamento, executar ações para reduzir o abandono e fomentar a adoção responsável.

Em Lisboa, a Câmara Municipal de Lisboa celebrou com a associação Animalife[1], em 8 de novembro de 2019, um protocolo destinado à proteção de animais detidos por pessoas em situação de sem-abrigo quando expostos, por força de circunstâncias meteorológicas, a episódios climáticos extremos de calor ou de frio.

De acordo com este contrato-programa, sempre que forem acionados planos de contingência para pessoas em situação de sem-abrigo, esta associação apresenta-se em Lisboa como a entidade responsável para prestação de assistência médico-veterinária, provendo ainda à distribuição de alimentos e abrigos (boxes, jaulas), ficando a Autarquia incumbida da limpeza dos espaços de abrigo cedidos, bem como pela transferência de uma verba para a associação, a título de apoio financeiro.

A assinatura deste recente protocolo veio reforçar a necessidade, há muito evidenciada pelas associações que atuam no terreno, de articulação entre as autarquias e as associações locais na concretização de medidas basilares, já que estas últimas dispõem dos conhecimentos, meios humanos e técnicos capazes de potenciar e ajudar no cumprimento das obrigações municipais e atenuar uma lacuna existente relativamente  ao bem-estar animal dos animais detidos pelas pessoas em situação de sem-abrigo em episódios climáticos extremos, ou seja, aquando do acionamento do Plano de Contingência para as pessoas em situação de sem-abrigo (PSSA) perante vagas de frio ou ondas de calor”.

Tendo em consideração os apelos que chegam de vários pontos do país relativos ao impacto da atual crise sanitária causada pela Covid-19, que veio agravar também o aumento de abandonos, em sede de proteção e bem-estar animal a capacidade de apoio autárquico, quer seja financeiro, quer seja material, deve ser melhorada e, por via disso, estendida a associações de defesa animal por todo o país, por serem estas que, em tese, poderão estar munidas dos requisitos necessários e considerados essenciais para a promoção do bem-estar dos animas detidos por pessoas mais carenciadas.

Sabendo-se que ao nível do orçamento familiar a Covid-19 está a ter um impacto dramático em milhares de famílias, para além dos animais detidos por pessoas em situação de sem abrigo, há muitos outros que vivem no seio de famílias que estão agora com grandes dificuldades económicas, e que também estas e estes precisam de ajuda e proteção que poderá passar pelo apoio com os cuidados de alimentação, como a oferta de ração[2], material de apoio (mantas, tendas, colchões, capas para o frio), cuidados médico-veterinários (vacinação, esterilização, desparasitação, medicação. tratamentos) e ainda para cumprimento de obrigações legais (registo, colocação de identificação eletrónica – chip).

Não devem ainda ser esquecidos os animais que se encontram à guarda de pessoas idosas, com reduzida ou limitada locomoção motora, e que também precisam, por exemplo, de ser passeados ou levados ao médico veterinário.

Por outro lado, parece-nos insuficiente que a implementação dos novos programas pelas autarquias ou mesmo na celebração de novos protocolos com entidades do sector social se restrinjam aos denominados animais de companhia (vulgo, cão e gato), olvidando outros animais, também eles carecedores de alimentos e cuidados, como é o caso, a título de exemplo, dos equídeos, roedores e aves, acolhidos quer por particulares, quer por associações, uma vez que o Estado ainda não dispõe de locais de alojamento para estes animais que se encontram não menos vezes ao abandono ou que foram apreendidos de locais que não detinham condições que salvaguardassem o seu bem-estar.

As políticas públicas devem estar alinhadas com os princípios e avanços que a legislação europeia e nacional tem consagrado, sendo incontornável o artigo 13.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia e mais recentemente o artigo 201.º-B do Código Civil em vigor, que reconheceu que os animais são “seres vivos dotados de sensibilidade”, impondo a par do reconhecimento desta natureza a adoção de medidas por parte dos entes públicos, que devem assim diligenciar pela proteção animal.

No âmbito das competências das autarquias locais, devem ainda ser promovidos e geridos programas de apoio social às pessoas que se encontrem em situação de vulnerabilidade social, e que necessitam de ajuda para garantir o bem-estar dos animais que integram  sua família, e que são até muitas das vezes a sua única companhia.

À semelhança de muitas outras áreas do sector social, formal ou informalmente, o que se verifica é que têm sido as parcerias com associações zoófilas destinadas à celebração de protocolos (ou outros mecanismos legais) que permitem que aos animais detidos por pessoas que se encontram numa situação de maior vulnerabilidade social seja assegurada alimentação, prestação de cuidados básicos de saúde, conforto, vida saudável e higiene.

Existem exemplos de boas-práticas em Lisboa, como as parcerias de natureza semelhante celebrados entre a CML e associações zoófilas, como a Animalife, a Animais de Rua e a Associação Zoófila Portuguesa.

Contudo, são muitas as associações que atuam quer no município, quer noutros locais do país, acolhendo animais, prestando cuidados médico-veterinários promovendo programas CED, sem que tenham qualquer apoio por parte das autarquias ou do Estado.

Não podemos ignorar que apesar de nos últimos anos a taxa de desemprego ter diminuído, dados recentes indicavam-nos que 2.2 milhões de pessoas vivem em situação de pobreza em Portugal. Sendo que mais de metade dos lares portugueses detêm animais de companhia. Dificilmente estes números não irão aumentar, face à grave crise económica provocada pela Covid-19.

Importa assim que também esta dimensão seja acautelada e que as autarquias, nomeadamente através das suas juntas de freguesia, criem programas que permitam a sinalização das famílias carenciadas e idosas detentoras de animais de companhia que necessitam de apoio.

Tais apoios, para além da relevância social que têm para estas famílias, devem ainda ser  inseridos nas politicas contra o abandono animal e  promoção do seu bem-estar, bem como possibilitar e facilitar a sua integração no seio de famílias mais carenciadas ou idosas.

Alguns municípios, na tentativa de mitigar os efeitos da crise sanitária que vivemos, estabeleceram programas de apoio que se têm revelado importantes para reduzir o risco de contágio e para minimizar a crise económica que se tem vindo a agravar, com um esforço orçamental significativo, extraordinário e imprevisto até março deste ano, em várias áreas de atuação, nomeadamente de apoio social, o que lhes irá colocar possivelmente dificuldades financeiras, mas têm igualmente incluído – e bem, esta dimensão da proteção animal.

Nos termos da Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto, respetivamente no seu artigo 2.º, são deveres do Estado, em conjunto com o movimento associativo e as organizações não-governamentais de ambiente e de proteção animal, dinamizar anualmente no território nacional campanhas de sensibilização para o respeito e a proteção dos animais e contra o abandono, cabendo ainda aos organismos da administração central do Estado responsáveis pela proteção, bem-estar e sanidade animal, em colaboração com as autarquias locais, o movimento associativo e as organizações não-governamentais de ambiente e de proteção animal, promover campanhas de esterilização de animais errantes e de adoção de animais abandonados.

Para que fosse garantido o efetivo cumprimento da referida Lei n.º 27/2016, que estabeleceu a proibição do abate de animais errantes como forma de controlo da população, foram disponibilizados pelo governo apoios financeiros de modo a ajudar os municípios a financiar as ações de esterilização, bem como para financiar a construção e obras de modernização dos Centros de Recolha Oficiais (CRO). Contudo esses apoios têm ficado aquém das necessidades das autarquias locais[3].

O Grupo Municipal do PAN propõe que a Assembleia Municipal de Lisboa, na sua Sessão Ordinária de 26 de maio de 2020, ao abrigo do disposto no artigo 15.º, alínea c) e do artigo 71º ambos do Regimento e do artigo 25.º, n.º2, alínea k) do Anexo I da Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro, delibere:

  1. Apelar ao Governo para que, à semelhança dos referidos apoios financeiros já disponibilizados aos municípios, tome as diligências necessárias para que seja implementada uma linha de apoio financeiro às autarquias locais para garantia dos programas de bem-estar animal, nomeadamente:
  2. Implantação de programas municipais que garantam o acesso aos cuidados de bem-estar animal, designadamente prestação de apoio médico veterinário, alimentação, bem como abrigos caso tal se revele necessário, aos animais que vivam no seio de famílias carenciadas ou que sejam detidos por pessoas em situação de sem-abrigo ou por pessoas idosas com dificuldades de locomoção;
  3. Que permita o estabelecimento, sempre que se revele necessário, de parcerias entre as autarquias e as associações zoófilas locais e/ou organizações equiparadas para cabal satisfação das necessidades referidas no número anterior;

Lisboa, 22 de maio de 2020.

O Grupo Municipal
do Pessoas – Animais – Natureza

 Miguel Santos – Inês de Sousa Real

[1] Associação nacional sem fins lucrativos que assume como missão a luta contra o abandono de animais de companhia, o apoio a detentores de animais em situação de fragilidade económica e social e também o apoio a associações de proteção animal

[2] A Animalife, em colaboração com autarquias como as de Lisboa, Oeiras, Sintra, Coimbra e Vila Nova de Gaia promove desde 2011 a distribuição de alimentos (rações) a partir dos espaços cedidos pelos municípios com quem mantém protocolos.

[3] Relatório sobre o levantamento dos centros de recolha oficial de animais e diagnóstico das necessidades, Setembro de 2017, Direção-geral das Autarquias Locais.